INSCRIÇÕES ABERTAS PARA O VESTIBULAR 2024.2 Fechar
 

Crédito: divulgação

Argo conseguiu ser um filme bem-sucedido pela capacidade de Ben Affleck de criar um thriller político divertido sobre um assunto complicado como a invasão da embaixada dos EUA no Irã. Porém, o vencedor do Oscar 2013 falhou ao colocar o povo iraniano como vilão da obra, dignos de poucas falas e atitudes radicais. Capitão Phillips (Captain Phillips, EUA, 2013) poderia ter caído no mesmo erro e tratado os piratas somalis como monstros da humanidade. Porém, o longa estrelado por Tom Hanks utiliza o cenário do sequestro de um navio para explorar o abandono da África com a imposição americana e a diferença entre dois homens que parecem viver em planetas diferentes.

O diretor Paul Greengrass se recupera do fraco Zona Verde ao apostar na tensão de obras como Voo United 93 e O Ultimato Bourne. Aqui, ele comanda a história do capitão de um navio cargueiro, Richard Phillips (Tom Hanks), sequestrado por piratas da Somália após a invasão da embarcação. No decorrer da trama, acompanhamos a negociação entre a Marinha dos EUA e os criminosos na tentativa de liberar o refém.

Adaptado do livro escrito pelo próprio Richard Phillips, o roteiro de Billy Ray (Jogos Vorazes e Plano de Voo) aposta as fichas no tenso duelo entre o líder dos piratas e o capitão sequestrado. Porém, antes do encontro, a obra estabelece pequenos detalhes entre o tipo de vida levada por ambos, dando complexidade à história. O americano mora em uma bela casa com a família, está em boa forma física, possui um importante e respeitado emprego no navio, onde pode desfrutar da cabine individual, tomar um bom banho e comer na hora que der vontade. Já Muse (Barkhad Abdi) dorme no chão de um barraco em uma favela da Somália, tem roupas sujas, empoeiradas, o rosto marcado pelos traços de magreza e trabalha como pirata para repassar dinheiro à gangue local.

Toda essa diferença social acaba sendo refletida durante as negociações do sequestro, já que o americano parece sempre capaz de antever cenários não imaginados pelo pirata. Esse antagonismo gera sentimentos dúbios entre os próprios protagonistas: Phillips percebe a ingenuidade e a encruzilhada em que os africanos se meterem ao mesmo tempo em que teme pela vida, enquanto Muse admira o refém pela inteligência, sabendo da necessidade de matá-lo caso seja preciso. O duelo também causa divisão no público, já que os dois podem ser encarados como vítimas: um de crime na acepção pura palavra e outro pela miséria humana a qual é submetido. Nada disso seria visível se não fosse o trabalho da dupla de atores excelentes da produção: Abdi se mostra uma grata revelação, enquanto Hanks consegue se livrar de uma fase lamentável e caminha para o terceiro Oscar da carreira.

Capitão Phillips, porém, se mostra mais do que um eficiente suspense montado com maestria por Christopher Rouse, parceiro de Greengrass desde A Supremacia Bourne. Em diversas tomadas, o diretor faz questão de mostrar o contraste entre o grande e milionário navio cargueiro sequestrado e a pequena lancha que transporta os piratas e, logo em seguida, o minúsculo barco contra as enormes embarcações da frota da Marinha dos EUA. Nestes trechos, fica clara a intenção de mostrar o poder americano perante os insignificantes africanos, sendo a violência a única forma de chamar a atenção para a tragédia humanitária ocorrida naquela parte do planeta.

Forte candidato a várias indicações ao Oscar 2014, Capitão Phillips seria um sucessor ideal para Argo ao trazer conteúdo político aliado ao entretenimento, além de resgatar Tom Hanks e Paul Greengrass.