A primeira tarde de debates sobre os 50 anos do Golpe Militar no Brasil agradou tanto historiadores quanto cinéfilos. A exibição do filme Estado de Sito, de 1973 (État de Siège, em seu título original), teve como mediador o professor José Augusto Dias e como principal tema a forma como o cinema político é feito e interpretado desde sua estreia até os tempos atuais.
O longa é dirigido pelo cineasta grego Costa Gravas e conta a história real de um grupo de guerrilheiros uruguaios intitulados “Tupamaros” que, em 1970 e vivendo sobre a forte ditadura militar-civil do Uruguai, resolvem intensificar sua luta armada através de diversos sequestros. Dentre as mais notáveis capturas estão a do cônsul brasileiro Aloysio Dias Gomide e do agente do FBI e “professor de torturas” Dan Mitrione que, no filme, são retratados com nomes diferentes. Além de extremamente verossímil, o longa é muito bem dirigido e possui um elenco de peso, encabeçado pelo ator Yves Montand.
Cult ou Anacrônico?
Assim que a exibição terminou, o professor José Augusto introduziu o filme, ressaltando fatos históricos e algumas curiosidades. O longametragem, apenas lançado no Brasil em 1981, ainda em anos ditatoriais, só foi permitido graças à realização de dois cortes. O professor explicou: “O primeiro corte foi a forte sessão de tortura que vocês viram, onde aparece a bandeira brasileira ao fundo, e a cena que mostra a chegada de duas pastas com instrumentos de eletrochoque em um avião brasileiro também foi cortada”.
Diretor de filmes como Z e O Quarto Poder, o cineasta Costa Gravas já é um veterano em cinema político e abordou de forma bem-resolvida a influência dos Estados Unidos nas ditaduras latino-americanas. Ao lado do professor e coordenador Adalton Diniz, José Augusto citou algumas frases do filme que ressaltam muito bem aspectos do regime militar. Um bom exemplo é quando o personagem Philip Santore, que é uma retratação cinematográfica de Dan Mitrione, diz a diversos representantes de polícias internacionais: “Vocês sabem, os governos passam, mas a polícia fica”. Tal afirmação pode ser considerada como uma prévia do que viria a seguir na América Latina: esquadrões da morte, torturas e, claro, as ditaduras militares.
Com tanta repressão, vieram os movimentos contrários a ela. Os professores disseram que a organização dos Tupamaros era reconhecida pela própria polícia uruguaia e admirada pelos guerrilheiros brasileiros. Algumas cenas do filme exemplificam bem tamanha organização. Durante os muitos interrogatórios, os guerrilheiros uruguaios apresentavam fotos, confirmavam dados de políticas internacionais (incluindo a política brasileira) que deixam o agente Philip abismado.
Finalizando o encontro, o professor José Augusto comentou como determinados filmes políticos parecem perder força nos dias de hoje: “Eu me lembro da época em que esses filmes foram liberados no Brasil. O primeiro foi Z e, quando a exibição terminou, lembro que ele foi aplaudido, ou seja, era outro clima, o clima do começo do desafogo da ditadura”. Porém, a opinião de todos no debate foi unânime, Estado de Sítio é um filme muito bem feito que mostra de forma clara como foi toda a campanha sistemática dos Estados Unidos nas ditaduras militares latino-americanas.