QUARTAS-DE-FINAL da Copa do Mundo. Estádio Nelson Mandela Bay, África do Sul, dois de julho de 2010. Brasil e Holanda duelam pela fase final da competição. O gol de Wesley Sneijder – o segundo dele na partida – decreta a eliminação brasileira e coloca a Holanda, país que nunca venceu a competição em que somos os únicos pentacampeões, na semifinal da Copa.
Na Holanda, assim como no Brasil, o futebol começa cedo na vida das crianças. No entanto, a diferença abismal é notada na estrutura disponível. Enquanto jogamos no asfalto, em campos de terra ou de areia da praia, no país europeu, em quase todos os bairros das cidades grandes – ou nos principais bairros das cidades menores – há uma quadra pública e bem conservada, seja num bairro abastado ou na periferia. Aberta à população, com iluminação e redes protetoras, são nessas pequenas quadras que os holandeses desenvolvem sua paixão pelo esporte.
LIBERATION DAY
Durante as comemorações do Liberation Day, em cinco de maio, a população holandesasaiu às ruas para exercitar suas atividades favoritas. O futebol, é claro, não ficou de fora. Com o apoio da Straatvoetbal Bond Nederland (SVBN) – uma federação criada somente para a prática do futebol de rua – crianças e jovens se reuniram nas praças próximas às suas residências na disputa do Nationale Straatvoetbal Kampioenschappen (Campeonato Nacional de Futebol de Rua).
Na competição, dividida em categorias entre 12 e 16 anos, as partidas eram disputadas com equipes de três jogadores – forma comum de se praticar o futebol de rua na Holanda. O evento ainda contou com a presença do patrono da SVBN, Edgar Davids, ex-jogador da seleção holandesa e, atualmente, embaixador do futebol freestyle pelo mundo.
Entre os espectadores, além de familiares e amigos, estavam presentes alguns dos organizadores do esporte local. Na quadra do bairro de Zeeburg, leste de Amsterdã, Joost Hartman, 44 anos, responsável por equipes juvenis da região, acompanhava as partidas e apontava a importância para a prática esportiva durante a juventude. “Especialmente para os mais jovens, o esporte é fundamental para uni-los. Em nossas equipes, além dos eventos esportivos, nós damos cursos e educação. Assim, no futuro, esses garotos estarão mais preparados para o mercado de trabalho”, comenta.
No outro lado da cidade, Ayoub Oulahiane, 21 anos, que ajudava na organização do evento na Lambertus Zijlplein, oeste de Amsterdã, explica como as partidas são marcadas entre seus amigos. “Muitas vezes nem precisamos nos falar, nós vamos até a quadra, por volta das 19h, e estão todos aqui”, afirma Oulahiane, que nasceu no Marrocos e se mudou para a Holanda aos dois anos.
FUTEBOL SOCIAL
Como no Brasil, o esporte tem grande importância social para os jovens da periferia. Hartman é enfático ao dizer que seu trabalho é focado na formação de cidadãos com caráter e exalta a importância da atuação de seus ex-alunos na continuação do projeto. “O futebol acaba sendo o primeiro contato desses jovens com educação e, muitas vezes, a primeira oportunidade de emprego. Para as crianças da periferia é muito bom ter um rosto familiar dizendo o que é certo ou errado. É a forma mais eficiente de atingi-los.”
No entanto, ele não deixa de alimentar os sonhos daqueles que anseiam o profissionalismo. Este é o caso de Youssef Morabiri, 19 anos, que atua profissionalmente em um clube de futebol de salão. “Hoje estamos participando deste campeonato, mas foi o futebol de rua que me deu essa oportunidade”, conta.
Oulahiane ainda destaca o esporte informal como uma boa ferramenta para o combate à xenofobia, uma realidade nas periferias dos grandes centros. “Jogamos juntos: quando estamos em quadra focamos no jogo e não na cor de pele ou na religião do cara ao lado. É algo muito positivo. O esporte une as pessoas, as culturas. Nós nos divertimos uns com os outros.”