Em 1980 foi publicado Lamarca, o capitão da guerrilha, obra de Emiliano José em parceria com o jornalista Oldack Miranda. O livro, utilizando-se de cartas de Carlos Lamarca, descreve a trajetória do ex-capitão do Exército Brasileiro, que diante do caráter repressor da ditadura militar instaurada em 1964, deserta no início de 1969, juntando-se a Vanguarda Popular Revolucionária e consequentemente à luta armada. Conforme a trajetória de Lamarca é narrada, não só suas estratégias e ações de combate são expostas pelos autores: eles têm uma preocupação em estabelecer um perfil que contemple aspectos mais subjetivos, como crenças, ideais e emoções.
Baseado nessa obra, o filme Lamarca, dirigido por Sérgio Rezende e lançado em 1994, mantém-se fiel ao livro de Emiliano. Apesar de utilizar-se de uma série de simbolismos explícitos, principalmente na sequência final, que não são oriundos da publicação, e intensificar a dramaticidade do enredo, a película acompanha a trajetória de Lamarca de modo similar, inclusive transpondo quase integralmente alguns diálogos. Optando por uma narrativa não linear em certos momentos, o filme dá maior foco aos dilemas enfrentados por Lamarca e as provações que enfrenta ao ser perseguido pelo Estado, além de explorar o relacionamento com sua esposa Maria Pavan (no filme é chamada de Marina) e Iara Iavelberg, sua amante e companheira de guerrilha no movimento MR-8 (que no filme recebe o nome de Clara).
Iniciando com a situação do sequestro do diplomata suíço em 1970 pela VPR e a negociação com o governo pela libertação dos presos políticos, a obra cobre desde o período em que Lamarca integrava o exército brasileiro – abordando sua promoção a capitão, suas qualidades como atirador e o início do contrabando de armas realizado por ele a movimentos armados – até sua morte em 1971, no interior da Bahia, perseguido pelos militares e forças da polícia local.
Com a participação de conhecidos artistas do cinema e da televisão brasileira, o filme desenvolve com muito mais detalhamento o arco dramático de seus personagens do que no enredo propriamente dito. Em relação ao personagem de Lamarca, por exemplo, a prioridade é desenvolver diálogos e questionamentos que impedem um retrato mais amplo da ditadura militar. Tendo como base seu idealismo e o forte apoio à esquerda, para o diretor é essencial mostrar como essas características o definem, sem a necessidade de aprofundá-las ou discuti-las de maneira mais incisiva.
Na discussão que se seguiu à projeção do filme, presidida pelo professor Adalton Diniz, Coordenador de Cultura Geral e com participação do professor Alexander Heisenbeck, de Ciência Política no curso de Publicidade e Propaganda. As principais questões levantadas se referiam à validade do uso da violência pelos movimentos armados e os vestígios políticos e sociais deixados pela ditadura. Ao debater sobre essas estruturas presentes ainda hoje na sociedade, os professores apontaram o contraste entre os dois momentos históricos, e indicaram a importância de uma ideologia consolidada para os movimentos de guerrilha, dando legitimidade a ações que atualmente seriam impensáveis. Após estabelecerem uma relação entre o movimento Black Bloc e movimentos armados, definiram como principal diferença entre eles “uma postura mais politizada, com causas melhor direcionadas”. O debate encaminhou-se então para a questão da liberdade de expressão; considerações sobre o real significado dessa expressão, a comparação entre a imprensa dos tempos de ditadura e a atual; consequências de uma liberdade de expressão absoluta.