Fabio Sirota tem 18 anos e é estudante de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (POLI – USP). Contudo, foram os anos de Ensino Médio, cursados entre 2011 e 2013 no Colégio Etapa – instituição de educação que direciona e incentiva os seus alunos na empreitada de olimpíadas culturais –, que semearam os ótimos frutos que, hoje, ele colhe.
Medalhista em duas edições da Olimpíada Brasileira de Física (OBF) com dois bronzes consecutivos, Fabio associou o seu sucesso precoce no campo acadêmico à oportunidade de conhecer e participar de projetos voluntários; projetos como o “Vontade Olímpica de Aprender”, carinhosamente tratado por “VOA!” por seus participantes, idealizado, inicialmente, por alguns colegas da sua turma do colégio.
De uma iniciativa cultural gratuita destinada a alunos da rede pública, a ideia que o Projeto “VOA!” procura desenvolver, desde o ano de 2010, é o interesse e a curiosidade dos seus alunos para com a vida acadêmica e para com o brilhante universo das olímpiadas de conhecimentos estudantis, um estímulo ao raciocínio, assim como “uma visão mais divertida e proativa em relação à Matemática”, na definição dos criadores.
A Escola Estadual Maestro Fabiano Lozano, localizada na Vila Mariana, bairro da região centro-sul de São Paulo, é a instituição que cede espaço aos mais de cem alunos envolvidos com as atividades do projeto. E é nesse cenário que aos fins de semana os estudantes que possuem um histórico escolar notável e uma base de instrução acadêmica notória dedicam-se à arte de lecionar – e Fabio, com muito bom humor, sequer importa-se com o dispêndio de tempo: o conhecimento é para ser passado adiante. Os voluntários do “VOA!” são os alicerces da educação que vem sendo construída no país, cuidam das asas de quem está aprendendo a voar.
O que é esse trabalho para você, qual a sua definição do “VOA!”?
Em poucas palavras, eu diria que é um projeto social que tenta abrir portas para as pessoas. Não só para os alunos, mas para nós da equipe [voluntários do projeto] também! Nós tentamos proporcionar aos alunos uma oportunidade de “aprender um pouco mais” e ver o mundo de forma diferente. E conseguimos não só desenvolver muito mais a nossa própria paciência e civilidade, mas também conhecemos um mundo novo, uma realidade diferente da nossa. É um projeto que abre portas: podem até serem pequenas, mas são portas que vão levar a muitos lugares.
Como e quando você começou a participar?
Comecei a participar no ano passado, em 2013, basicamente para conhecer, ver como seria dar aulas. Foi algo meio egoísta, talvez; a minha mentalidade sobre o projeto foi voltada para que eu me conhecesse melhor e visse como seria, como eu me sentiria se eu desse aulas. Mas depois de ver os alunos e conhecê-los melhor, posso afirmar que não estava “nem ligando” para a questão de dar as aulas propriamente, mas sim para poder ajudá-los.
Que tipo de contribuição você sente que o “VOA!” proporciona aos seus alunos?
É uma definição bem aberta, mas acho que posso dividi-la em três. Em primeiro lugar, o “VOA!” pode dar uma contribuição à didática mesmo. Conseguimos passar um pouco do conhecimento que tivemos com outros professores para os nossos alunos. Além disso, o fato de poder ajudar, talvez, na questão de cidadania, ser como um exemplo para eles. Tem muitos alunos que admiram muito o projeto, e cabe a nós fazer jus a essa admiração. E, por fim, poder ser de uma ajuda mais pessoal, poder trazer uma alegria para as crianças, e não uma punição, já que eles estão na escola aos domingos para aprender matemática. Muitos deles ficam nossos amigos pela convivência.
Convencê-los de que estudar não é uma coisa chata…
Sim, exatamente!
E como é o retorno desses alunos?
Um retorno pedagógico nós observamos, sim. Os alunos realizam provas durante os anos e há uma grande melhora no desempenho deles. E, além disso, alguns também conseguem conquistar medalhas olímpicas ou bolsas em colégios particulares e cursinhos.
O que muda na vida deles? Na vida social, além da escolar.
No quesito social, além de tentarmos elevar um pouco o nível pedagógico, nós tentamos mostrar o mundo de uma forma mais lógica, uma forma mais real possível. E eles reagem a isso, apresentam um retorno, principalmente pelos pais. Os pais nos dizem que eles mudam bastante, amadurecem tanto por passar a ver o mundo de uma forma diferente quanto por desenvolverem uma disciplina, a ponto de conseguirem estudar e aprender porque querem, e não porque precisam.
Como é ver o mundo de forma lógica? Você vê o mundo dessa forma?
Acho que sim. Talvez não de uma forma lógica completamente, mas sim de uma forma mais organizada. Por exemplo, para resolver um problema de matemática é preciso dividi-lo em diversas partes. Talvez isso ajude muito mais na vida do que as pessoas pensam. Dividir a vida em menores pedaços, seja um dia ou uma hora de cada vez, ajuda muito em diversas situações.
Quando você começou a se interessar por isso, por ser professor?
Quando eu comecei a ver que ser professor era muito mais do que simplesmente “passar matéria”, ensinar algo em específico, e sim uma questão de cidadania, uma série de lições para a vida: amizade, fraternidade, entre outras coisas. Hoje eu vejo que isso é possível de diversas formas, mas foi a tentativa de ser professor que me abriu as portas. Portas que só esse projeto me abriu.
A experiência com o Colégio Etapa com certeza influenciou você bastante!
Sem dúvida. O Etapa me proporcionou uma nova visão sobre ser professor e isso me motivou a ir atrás para conhecer melhor essa carreira.
Alguém em especial te inspirou?
Acho que os professores do ensino médio me influenciaram de várias maneiras diferentes, cada um com a sua particularidade. O Luiz [Luiz Carlos Dias, professor de português] por suas lições de vida, o Aruak [Aruak Gomes, professor de biologia] por suas lições de companheirismo e o Emiliano [Emiliano Chagas, professor de matemática, mentor e instrutor do “VOA!”] pelo seu método de ensino, conciliando conteúdo a uma relação de amizade com os seus alunos.
O que esses professores ensinaram a você, além das suas matérias?
Eles me mostraram muita coisa. Eu vi que a vida não é só “farra”, mas que também não é só trabalho; que é importante aprender a conhecer a si mesmo e tomar riscos no correr da vida. E o mais importante: que a vida não é pra ser vivida sozinha. Acho que são as questões principais.
Sobre o Colégio Etapa: os seus amigos também dão/davam aulas no “VOA!”. Como é isso? Como vocês se relacionavam lá?
Alguns participaram sim, mas a maioria é de outros anos do colégio, não são da minha turma. No projeto nós somos bem unidos, sem muita hierarquia e sempre tentamos fazer o melhor para os alunos. Afinal, estamos lá pelo mesmo propósito! Sem dúvida muitos dos que estão lá trabalhando comigo são meus amigos e tentarei guardá-los por um bom tempo.
E que papel você desempenha hoje no “VOA!”?
Como o idealizador do projeto, o Vaz [Henrique Vaz] vai para os EUA em agosto [Henrique Vaz foi aprovado e iniciará os seus estudos no ensino superior na Universidade de Harvard, localizada em Cambridge, Massachusetts, Estados Unidos], eu assumi uma boa parte do seu papel no “VOA!”. Sou o coordenador pedagógico e financeiro, cuido da parte dos alunos com a equipe, da manutenção das atividades e dos aspectos financeiros.
Foi de iniciativa própria?
Sim. Eu percebi que o projeto não conseguiria se manter sem alguém para suprir tais demandas. Pelo afeto que eu tenho pelo “VOA!”, não poderia simplesmente vê-lo perecer assim. Sinto falta de dar aulas, mas é uma experiência bem interessante. É melhor para o projeto que eu continue onde estou hoje.
E como fica a sua rotina com o projeto?
Antes era um pouco mais livre. Eu tinha que preparar as aulas e dá-las aos domingos. Hoje, a minha função demanda muito mais tempo online, digamos. Seja organizando as questões internas ou conversando com os patrocinadores, entre outros contatos profissionais. Mas eu consigo conciliar a faculdade com o projeto. É algo que demanda tempo e organização; tive que abrir mão de certas coisas, mas nada de que eu me arrependa.
E como você acompanha tudo isso? Frequenta o “VOA!” todos os domingos do mesmo modo de quando era apenas professor?
Sim. Continuo indo todos os domingos, não é algo de extrema necessidade, mas gosto muito do pessoal da equipe e dos alunos. E é algo que vale a pena, sem dúvida. Eu também acho mais fácil organizar tudo tendo um contato mais próximo tanto com a equipe quanto com os alunos.
E quais são os novos projetos que vocês têm em mente?
Nós estamos estudando para montar apostilas tanto para reforços escolares como voltadas para treinamentos com ênfase em olimpíadas culturais. Dessa forma fortaleceríamos o projeto que temos hoje e também traríamos certa independência a ele. Hoje somos bancados por um patrocinador; com essas apostilas, venderíamos o nosso “sistema” para algumas prefeituras, que já mostram interesse, e assim tornaríamos o projeto independente financeiramente.
Como é a relação com esse patrocinador?
É uma grande empresa, na verdade um banco de sangue [COLSAN – Associação Beneficente de Coleta de Sangue]. Conhecemos alguns empresários que se mostraram interessados em nos patrocinar e logo conseguimos apresentar o projeto, ter as aprovações e lidar com as burocracias. Temos uma relação “benéfica mútua”, digamos assim. Nós proporcionamos uma boa imagem e sempre tentamos divulgar a COLSAN, além de realizarmos palestras sobre doações sanguíneas, entre outros assuntos.
E como o Rotary Clube Bela Vista-Bexiga e o Rotary Clube Aeroporto [parceiros de projeto] auxiliam o “VOA!”?
O Rotary [Rotary Clube Bela Vista-Bixiga – Distrito 4610 e o Rotary Clube Aeroporto – Distrito 1] já foi nosso apoio financeiro, mas, agora, contamos somente com o apoio logístico de pessoal; são pessoas muito bem intencionadas que procuram nos ajudar da forma que melhor podem. Eles nos ajudam muito! Não conseguiríamos realizar tudo o que fazemos se não fosse por eles. Principalmente a parte de português que lecionamos no projeto, pois a realizamos de manhã e requeremos pessoas para fazer a entrada e saída de alunos. O Rotary nos ajuda bastante nesse aspecto, pois há integrantes que sempre chegam lá às 7h50 para fazer a supervisão dos alunos. Não são muitos que podem (ou querem) fazer essa parte, cuidando para que os alunos não saiam principalmente (risos).
Como funciona essa parte de português do Projeto “VOA!”?
A aba de português do projeto é mais voltada para interpretação e construção de textos. Essa parte tem um foco nessas áreas da língua para não somente auxiliar a parte de compreensão da matemática, mas principalmente para que possamos “formar” alunos mais capacitados para o mundo. Saber ler e escrever adequadamente é uma ferramenta de vital importância em qualquer área do conhecimento e da vida como um todo. Mas sobre essa importância, eu acho que você sabe falar muito mais do que eu.Sou parte de uma amostra suspeita! (Risos.) Um complementa o outro. Cada um tem seus pontos fortes e sabe expressar coisas específicas.
A sua relação com o colégio mudou depois do “VOA!”?
Mudou muito, o projeto transformou a minha visão sobre o colégio, encaro como algo muito mais importante do que eu podia lidar antes. Não só a respeito da relevância da parte acadêmica para a base de uma pessoa, mas principalmente sob o aspecto de conhecimentos e experiências de vida que adquirimos.
Como está a faculdade?
A minha rotina anda meio caótica com a greve de cálculo que teve, mas vamos acabar dentro do programa, acredito. Preciso só tirar nota três para passar em duas matérias desse semestre, então está “suave”.
E você sabe em que área pretende atuar quando deixar a faculdade?
Não sei ao certo… Talvez eu faça uma formação mais geral e vá ou para a área financeira ou para a área de consultoria. Atualmente é o que mais me chama a atenção.
A mesma função que você exerce no “VOA!”!
Sim! Sem dúvida alguma poder fazer isso no “VOA!” despertou o meu interesse para essa área.