Por Ana Luiza Sanfilippo, estagiária do Núcleo de Mídias Digitais
Em qualquer editoria o jornalismo de dados terá a mesma função: coletar, analisar e interpretar dados. E a partir dessas resultados, é possível criar uma narrativa jornalística e produzir materiais mais precisos. Adalberto Leister Filho, diretor de conteúdo do Máquina de Esporte e professor da Cásper Líbero na matéria jornalismo de dados na pós-graduação, explica melhor esse conceito:
“Com isso, somos capazes de produzir reportagens mais precisas, de maneira mais sofisticada e que sejam capazes de retratar uma realidade social, tendência ou explicar a trajetória de determinado problema. O esporte é apenas mais uma das áreas do jornalismo que pode se beneficiar do jornalismo de dados.”
O jornalismo de dados possibilita a execução de um jornalismo mais confiável. Por meio desses dados, é possível investigar os mínimos detalhes de uma informação e evitar ao máximo erros de apuração. Mais do que isso, apresenta-se como uma tentativa de racionalizar a produção jornalística e baseá-la na técnica de análise de dados.
No esporte funciona da mesma forma. O mundo esportivo, assim como qualquer meio jornalístico, depende de muitas informações todos os dias. Se pararmos para pensar na quantidade de esportes noticiados todos os dias, com uma infinidade de nomes, lugares e narrativas presentes, o jornalismo de dados surge como uma excelente aliada.
O professor Leister comenta sobre afirmando que o maior benefício do jornalismo de dados no esporte foi a diminuição dos “achismos” que duraram décadas. Agora é possível confirmar hipóteses com embasamento:
“Muitas vezes, após a coleta de grandes quantidades de dados, conseguimos enxergar uma situação que surpreende o próprio repórter. Muitas vezes iniciamos a coleta de dados com a expectativa de que eles irão mostrar determinada situação. Muitas vezes, mostram outra realidade. Se o jornalismo de dados surpreende o repórter, que dirá o público!”
Cada empresa ou jornalista pode fazer a mensuração de dados da forma que preferir. Porém, existem algumas ferramentas que podem ajudar.
As próprias plataformas do Google podem colaborar com a pesquisa. Com o Google Trends, é possível identificar tendências na internet e quais são os assuntos mais comentados. O Google Data Studio facilita a criação de relatórios e dashboards interativos, permitindo que jornalistas visualizem e compartilhem dados de maneira compreensível e visualmente atraente. Google Public Data Explorer ajuda os jornalistas a explorar grandes conjuntos de dados públicos e criar visualizações interativas, tornando a interpretação e a apresentação dos dados mais acessíveis.
Enfim, há uma variedade de formas de utilizar as facetas do Google para ter uma noção maior das informações. Aqui no Brasil, outro parceiro do jornalismo é o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Pesquisa).
O IBGE fornece uma ampla gama de dados estatísticos e geográficos sobre o Brasil, que ajudam os jornalistas a criar reportagens bem fundamentadas e informativas. O instituto auxilia principalmente nos fatores censo demográfico, banco de dados, geoinformação e indicadores socioeconômicos.
Existem vários jeitos e softwares adequados para estruturar uma matéria. Dependendo da editoria, talvez uma plataforma faça mais sentido do que outra. No caso dos esportes, por exemplo, uma boa fonte de dados pode vir do próprio clube esportivo.
O professor comenta que sempre utilizou esses recursos, principalmente quando trabalhava em redação:
“A partir dos dados, acho sempre necessário humanizar a reportagem. Ou seja, ouvir fontes, especialistas, protagonistas, etc. que podem contextualizar, explicar, analisar e referendar esses dados. Dados não são a reportagem. São ferramentas (bastante úteis) para elaboração de reportagens.”
Infelizmente, o jornalismo esportivo acumulou com os anos uma fama de que não é necessária muita apuração, basta assistir aos jogos e comentar. Essa visão, na prática, se mostra antiquada. Na entrevista com o professor Adalberto, ele comentou duas ocasiões em que o jornalismo de dados se mostrou muito útil em coberturas esportivas:
“Na ocasião, queria quantificar as marcas de esportes como atletismo e natação ao longo da história para mostrar em quais Olimpíadas houve melhoras mais significativas nos tempos dos medalhistas e obtenção de recordes. Com esses dados em mãos, procurei especialistas em cada modalidade para analisar porque tais anos foram tão fundamentais para o desenvolvimento das marcas daquele esporte? Por que houve melhora significativa das marcas do atletismo no México 1968? Qual o motivo de a natação ter bombado tanto em Sydney 2000? Há razões para isso. Sejam elas de desenvolvimento de material esportivo, dos locais de competição, clima, temperatura, profissionalização dos atletas, etc. Os números levantados pelo jornalismo de dados ajudam a referendar isso. Mas sem análise dos especialistas, não temos reportagem.”
Na ocasião contada acima, o professor trabalhava no Delta Folha durante a cobertura olímpica em Tóquio, em 2020. O jornalista adiciona às provas da importância do jornalismo de dados no esporte outro acontecimento:
“Em 2003 houve um grande escândalo de doping no atletismo dos Estados Unidos, o que levou alguns atletas a serem banidos, perderem medalhas e inclusive serem presos. Na época, estava começando a utilizar o Excel para elaborar minhas reportagens. E fiz um levantamento dos casos de doping naquele ano no mundo todo. E, para a minha surpresa, o país que era campeão de doping no planeta naquele ano não era os Estados Unidos, e sim a Rússia. Aquela reportagem, publicada na Folha em 2003, já mostrava uma tendência que fez com que o país, décadas depois, fosse banido do Movimento Olímpico. Os dados me surpreenderam na época. O tempo mostrou que o problema do doping era ainda mais epidêmico no esporte russo do que no norte-americano.”
Sobre um exemplo atual, o especialista menciona o balanço financeiro dos clubes brasileiros. Como virou usual que os times publiquem seus balanços por volta de abril e maio, é possível examinar a situação financeira de cada time, nível de endividamento, fontes de receitas, faturamento, etc.
Adalberto complementa a tese afirmando que a cobertura com o auxílio de dados é cabível em qualquer modalidade.
Com o uso de jornalismo de dados no esporte, fica mais fácil de fazer constatações com embasamento teórico e científico, principalmente nessa área que gera muita divergência.
Assim, utilizando os dados, podemos analisar o desempenho de um jogador ou de um clube nos últimos anos, fazer uma pesquisa sobre padrões de jogo e possíveis simulações, monitorar lesões e desempenho físico, acompanhar as expectativas do público e fazer coberturas de eventos com mais informação.
O professor finaliza dizendo que, com os dados, o público consegue compreender melhor o que o jornalista está querendo dizer:
“Acredito que ao mostrar a realidade do esporte de maneira mais exata, o jornalista de dados consegue iluminar uma situação para o grande público. O sucesso de uma reportagem utilizando ferramentas do jornalismo de dados, além de levantar imensas quantidades de dados, é ser capaz de mostrar, didaticamente ao leitor, a situação retratada. Não adianta nada fazer grandes levantamentos, se eles não forem compreendidos pelo público. “
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