Por Ana Luiza Sanfilippo, estagiária do Núcleo de Mídias Digitais
Possivelmente você já ouviu falar sobre doramas, as famosas séries japonesas que tomaram conta da indústria cultural nos últimos anos. Com o tempo, não somente o Japão continuou a produzir esse conteúdo, mas também outros países da Ásia como a Coreia do Sul e a China.
O significado da palavra dorama vem da palavra drama. Ou seja, essas produções costumam ter uma narrativa dramática e se assemelham levemente com as novelas brasileiras e séries norte-americanas.
Apesar de serem conhecidas como “novelas asiáticas”, o conteúdo apresenta mais um formato de seriado do que de novela, diferentemente da Índia e da América Latina. Cada país do leste asiático produz um tipo de dorama que mais representa a sua cultura e valores, trazendo elementos comuns do dia a dia. Um dorama sul coreano, por exemplo, tende a ter um estilo leve e cômico, enquanto os j-dramas costumam abordar assuntos mais sérios e dramáticos.
Para entendermos melhor o que são os doramas, conversamos com o professor Luís Mauro de Sá Martino, professor da Faculdade Cásper Líbero e doutor em ciências sociais, e com Juliana Machado, coordenadora de marketing digital e performance da Fundação Cásper Líbero. Ambos são fãs e consomem doramas frequentemente.
O início do dorama
Esse tipo de produção audiovisual surgiu no Japão durante a década de 1950 e era produzido e assistido pela televisão. Temas como a família, romances e relações interpessoais entre os personagens eram os mais comuns. Posteriormente, na China, os C-dramas surgiram, e lá pelos anos 80, os k-dramas (doramas sul coreanos). Porém, durante esse tempo, os doramas eram mais conhecidos pelo leste asiático, não tinha uma força tão grande internacionalmente.
Dessa forma, em meados dos anos 2000, quando a cultura asiática cresceu muito com os animes (animações japonesas), outros itens midiáticos de países como Japão, China e Coreia do Sul começaram a ser procurados pelo resto do mundo. Consequentemente, nessa procura, os doramas foram encontrados e foram ganhando espaço na cultura pop.
Atualmente, nas principais redes de streaming, os doramas dominam parte da plataforma e fazem muito sucesso. Round 6, por exemplo, foi uma febre no Brasil, o que gerou até propaganda com a empresa de fast-food Burger King na Avenida Paulista, principal avenida brasileira.
A identificação, segundo o professor Luís Mauro, acontece:
Tem duas coisas bem contrastantes. A primeira é como as coisas são comuns. A pessoa tá lá do outro lado do planeta, criada numa cultura completamente diferente e de repente você percebe que ela tem a mesma alegria que você ou ela tem o mesmo medo que você.
Existe uma diferença cultural muito grande, mas isso torna o conteúdo ainda mais interessante.
O crescimento mundial
Existem doramas que fazem muito sucesso nos seus respectivos países de produção e existem os famosos doramas de exportação.
Essa frase da Juliana Machado enfatiza como os doramas viraram um produto mercadológico. Em 2022, segundo uma pesquisa do governo da Coreia do Sul, o Brasil foi o 5º país que mais consumiu doramas, principalmente por conta do Hallyu, ou seja, onda coreana. Com a popularização do K-pop no Brasil, a busca por produtos de origem sul-coreana cresceu exponencialmente. E, principalmente durante a pandemia, o consumo de trabalhos audiovisuais coreanos cresceu muito no Brasil, que ficou em 3º lugar no ranking de países que mais assistiram produções sul-coreanas em 2020 segundo o Ministério da Cultura, Esportes e Turismo da Coreia do Sul.
Assim, o Hallyu se tornou mais forte após dois acontecimentos: Parasita vencendo o Oscar em 2019 e o sucesso do dorama Round 6. Parasita foi o primeiro filme de língua estrangeira a levar a estatueta dourada, após 90 anos de existência do evento. Em seguida, o filme fez tanto sucesso que o público começou a buscar mais produções asiáticas, o que abriu espaço para outros trabalhos como Vidas Passadas (2023), Dias perfeitos (2023) e Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo (2022). Round 6 criou o mesmo efeito no qual, lançado em 2021, abriu espaço para mais consumo do gênero na Netflix.
De acordo com Ted Sarandos, diretor executivo da Netflix, 60% de seus assinantes já consumiram algum projeto audiovisual sul-coreano, com 90% deles estando fora da Coreia do Sul, o que fez com que a empresa investisse US$2,5 bilhões na Coreia do Sul. Esse investimento adicional foi confirmado durante uma reunião entre o presidente sul-coreano, Yoon Suk-yeol, e Ted Sarandos, em Washington (EUA).
Como os streamings e a internet ajudaram no Hallyu
O professor Luís Mauro enfatiza que as redes sociais e os streamings foram dois agentes responsáveis pela disseminação do conteúdo.
As redes sociais permitiram que os fãs se mobilizassem para conseguir outros fãs. Se tem uma coisa que fã gosta, é de converter pessoas.
O fandom dos doramas ajudou a mostrar para o mundo as suas produções favoritas, o que fez com que a comunidade crescesse muito de alguns anos para cá, rendendo até pesquisas acadêmicas, como enfatizou o doutor em ciências sociais.
Por serem oferecidos de forma fácil e prática, o acesso se torna frequente. O formato também contribui para que sejam conteúdos bons de se maratonar, e após o término de um, o telespectador vai querer mais. De acordo com um estudo feito pela Netflix, entre 2019 e 2022 o consumo desse tipo de conteúdo sextuplicou. E durante o primeiro semestre de 2023, cerca de 16 doramas chegaram no Top 10 produções mais assistidas no Brasil.
Além disso, o professor também comenta como essa influência funciona como soft power, que seria a forma como a cultura de determinado país o faz crescer econômica e potencialmente.
Juliana Machado confirma e completa que o formato dorama vem crescendo principalmente pela narrativa:
Algo que me chama muita atenção, de fato, é a profundidade que eles trazem no roteiro para certas histórias.
Juliana dá o exemplo de HomeTown Cha-Cha-Cha (2021), que a tocou devido à narrativa da relação de um dos personagens com uma idosa.
A estrutura de um dorama
Normalmente, doramas têm cerca de 1h/40min de duração por episódio e uma média de 20 episódios por temporada. As produções não costumam ter mais de uma temporada, mas pode acontecer, como no caso de Midnight Dinner: Tokyo Stories. A narrativa foca na relação entre os personagens e, a partir disso, seguem um gênero, como romance, comédia, drama etc.
Os doramas, principalmente os sul-coreanos, expressam muito bem as emoções humanas. Tendem a ter um caráter envolvente e começo, meio e fim. Dividem-se em alguns tipos de acordo com o público-alvo, como séries que abordam o cotidiano, produções de época, suspense ou até histórias românticas. Além disso, os personagens são bem desenvolvidos e suas descrições demandam um tempo de duração.
Indicações de doramas
Por fim, o professor Luís Mauro e a coordenadora de marketing digital Juliana Machado fizeram algumas sugestões de doramas para assistir:
Pousando no amor – Netflix (2019)
Um acidente de parapente leva uma herdeira sul-coreana à Coreia do Norte. Ali, ela acaba conhecendo um oficial do exército, que vai ajudá-la a se esconder. Estrelado por Hyun Bin e Son Ye-jin.
Hometown Cha-Cha-Cha – Netflix (2021)
Uma dentista da cidade grande abre um consultório em um vilarejo litorâneo e conhece um faz-tudo que é o extremo oposto dela. Estrelando Shin Min-a e Kim Seon-ho.
Kantaro – Netflix (2017)
Kantaro termina suas visitas aos clientes o mais rápido possível para ter tempo de curtir sua jornada em busca dos doces mais saborosos. Estrelando Matsuya Onoe, Ren Ishikawa e Hiroyuki Onoue.
Samurai Gourmet – Netflix (2017)
Recém-aposentado, Takeshi redescobre a paixão pela vida e pela comida ao entrar em contato com seu guerreiro interior e passar a comer o que dita seu coração. O elenco é composto por Naoto Takenaka, Tetsuji Tamayama e Honami Suzuki.
Midnight Dinner: Tokyo Stories – Netflix (2016)
Os clientes de um restaurante japonês encontram conexões profundas entre si a partir do interesse compartilhado pelo mesmo prato. Protagonizado por Kaoru Kobayashi, Mansaku Fuwa e Toshiki Ayata.
Gostou do assunto e quer saber mais sobre? Assista a esse bloco do Edição Extra que explica mais sobre doramas e o seu impacto mundial.
