A censura ao teatro e a literatura durante a ditadura militar foi debatida na noite de 31 de março no Teatro Cásper Líbero – na Semana dos 50 do Golpe de 1964. Os convidados do debate, contudo, foram além: revelaram que a censura é uma prática muito anterior ao poder dos militares e que ainda assombra artistas por todo o país.
Tais ideias foram expostas pela professora Maria Cristina Castilho, socióloga que leciona na ECA-USP. “A cultura da censura é muito anterior a nossa imprensa, nosso cinema, nosso teatro. A nossa cultura é amordaçada”, afirmou. Segundo o breve histórico por ela apresentado, a coroa portuguesa proibiu a imprensa no Brasil até 1808. Entre 1834 e 1843, o teatro foi proibido. As companhias que poderiam criar peças aqui eram europeias, pois o teatro não poderia expressar nenhum descontentamento do povo brasileiro.
Maria Cristina realizou estudos no Arquivo Miroel Silveira, na USP, que trazem mais de seis mil processos de censura a peças teatrais entre as décadas de 1930 e 1970. A ditadura militar só fez tornar a censura fisicamente violenta, especialmente com o Ato Institucional 5 (AI-5).
A professora Roseli Fígaro Paulino, que também leciona na ECA-USP e participou dos estudos nos Arquivos Miroel Silveira, revelou que a censura não atingia apenas as grandes companhias, mas também os grupos amadores, fazendo os produtores perder investimentos em suas peças.
O escritor Ivan Ângelo pontuou que o mercado editorial sofreu também com a perda de investimentos. “A censura começava com os autores, e depois passava para os editores. Muitos livros foram incinerados. E com medo de perder dinheiro, os editores realizavam uma autocensura.”
A relação da grande mídia com a ditadura foi abordada por Ângelo e também por Alípio Freire, escritor e jornalista. “Os donos dos jornais não eram censurados antes do golpe. Houve uma divergência de interesses entre eles e os militares, por isso deixaram de apoiar o regime”, contou. Segundo Ivan Ângelo, os jornalistas se incomodaram com a presença do censor na redação do Jornal da Tarde. “Certa vez, nós saímos e o deixamos sozinho.”
Thiago Vasconcelos, diretor da Cia. Antropofágica, alertou que ainda hoje há mecanismos que tentam censurar a produção teatral, “como a lei de renúncia fiscal, que dá a marketeiros de empresas privadas o poder de decidir sobre onde acontecerão os espetáculos”. Nas palavras de Alípio Freire: “sobrevivemos ao pau de arara, mas o pau de arara também sobreviveu”.