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Priorizar o transporte público; restringir a aprovação de empreendimentos que não estimulam o uso do carro, e oferecem muitas vagas de garagem, por exemplo; considerar um mínimo de áreas verdes e equipamentos públicos em cada uma das regiões; prever a criação de um plano de drenagem que não se restrinja à construção de piscinões, como vem acontecendo atualmente e ampliar córregos e galerias, e não ocupar áreas de várzea, como pretende fazer o chamado Arco do Futuro da gestão Haddad, são algumas das questões em pauta não apenas nos resultados do Projeto DNA Paulistano como também por parte de urbanistas e entidades que representam os cidadãos paulistanos como a Rede Nossa São Paulo e o Movimento Defenda São Paulo.

Mas quando se trata de como viabilizar essas propostas é que vêm as grandes questões. De um lado, o poder público diz que não há verba suficiente para fazer as reformas e transformações que se precisa fazer; de outro, arquitetos, urbanistas e sociedade civil reivindicam maior participação população nos processos de tomada de decisão do que se vai fazer e, principalmente, nos debates que irão decidir de onde vem o dinheiro que será utilizado nestas obras.

O Arco do Futuro é um dos principais projetos do prefeito Fernando Haddad (PT) durante a campanha e promete reorganizar a cidade a partir da geografia dos rios, onde estão localizados os pólos de geração de emprego e renda na cidade de São Paulo. As linhas de transportes que se tornaram os principais acessos para os moradores das áreas mais distantes serão um dos pontos centrais do projeto, assim como as regiões aonde pode haver mais áreas de lazer.

Para o vereador Nabil Bonduki, a grande questão não é discutir o Arco do Futuro em si, mas de que forma queremos que ele se realize nas áreas mais precárias da cidade, como as regiões de várzea ao longo dos Rios Tietê e Pinheiros, por exemplo. “Nós temos muito poucos recursos disponíveis. Quando a gente pensa no que a gente quer fazer, é preciso pensar também no orçamento. Essa é uma das grandes polêmicas envolvendo a realização dos projetos: nós vamos ter dinheiro para realizar essas obras só com o orçamento da prefeitura? Ou vamos ter que tentar parcerias público-privadas? Mas aí vem a questão de essa parceria ser vantajosa também para as empresas privadas, essa é a grande polêmica”, explica Bonduki.

Segundo ele, o mais importante neste momento de reelaboração do Plano Diretor é discutir o que queremos para cada uma das regiões da cidade, e se essas obras são mesmo necessárias e, em seguida, pensar em como viabilizá-las. “Falar em Arco do Futuro é muito genérico, o que está em discussão não é o Arco do Futuro, mas alguns trechos do Arco do Futuro, como o do Rio Tietê. No meu ponto de vista, o que nós precisamos é ter muito claro e debatido com a sociedade o que nós queremos para aquela região. A partir da discussão do que se quer para aquela região nós vamos fazer a questão seguinte que é como vamos financiar aquilo que queremos e, evidentemente, nós temos que trabalhar aí com as várias questões que estão envolvidas, porque nós temos questões viárias, ambientais, de uso do solo, de localização da população, e todas essas questões devem ser levadas em conta para que a gente tenha um projeto efetivamente representativo do que deseja a população de São Paulo”, declarou o vereador.

De acordo com especialistas, o projeto é preocupante porque pode resultar na impermeabilização das margens dos rios que, com o maior adensamento, podem fazer com que as áreas de várzeas não tenham o seu espaço respeitado, causando ainda mais transtornos ambientais.

O território do Arco Tietê compreende cerca de 60 milhões de metros quadrados, e consiste na intersecção do eixo do Arco do Futuro (programa de desenvolvimento urbano proposto na campanha do Prefeito Haddad), que engloba as cabeceiras das represas (Billings e Guarapiranga), passando pelas planícies fluviais dos rios Pinheiros e Tietê, e se estende até o Parque Ecológico do Tietê e o eixo das diagonais norte e sul, áreas previstas no Plano Diretor Estratégico vigente.

Para a urbanista Raquel Rolnik, as parcerias público-privadas não parecem uma boa saída. Segundo ela, quando se trata de planejar o espaço público nem sempre esse tipo de parceria é o instrumento mais adequado, pois tendem a subordinar o interesse público aos ditames das grandes empresas preocupadas, quase sempre, apenas com a lucratividade. E no caso da região do Arco Tietê, essa discussão é particularmente sensível.

No site da Rede Nossa São Paulo, o também urbanista João Sette Whitaker explica que toda a área nas margens do Rio Tietê é resultante da retificação das várzeas por onde o rio fazia antigamente seus meandros. Com o tempo, muitas terras públicas da região foram vendidas, em grandes lotes que serviram a indústrias, shopping-centers e grandes empresas comerciais e de logística, e outras áreas públicas foram concedidas pelo poder público em uma espécie de “empréstimo” válido por décadas, para o uso de clubes e instituições. E algumas poucas, ainda, foram simplesmente “ocupadas”.

Para Whitaker, na São Paulo atual, com a bolha de valorização imobiliária que se vê, as terras para empreendimentos imobiliários ficaram raras e, nesse cenário, a região da Marginal do Tietê tornou-se uma das poucas da cidade a ainda oferecer grandes glebas, propícias a grandes empreendimentos. “Vê-se, portanto, que o planejamento da área, remanejando os usos dos antigos galpões e modernizando-a urbanisticamente, ganha um interesse todo especial”, afirma no artigo “Que futuro para o arco do futuro?”.

Em seu blog, Raquel Rolnik destaca que estamos vendo se desenhar um projeto que parte do pressuposto de que vai enterrar a linha do trem e construir um viário sobre esta, e protesta: “mais uma vez o pressuposto ‘qual é a grande obra viária que vamos fazer?’, que orientou a maior parte dos governos de nossa cidade, aparece. Ótimo para empreiteiras de túneis e avenidas, ótimo para aparecer no rol das atuações dos prefeitos/governadores. Mas seria ótimo para a cidade? Será que é isso que a cidade quer? E se os trilhos na superfície alavancarem um transporte de massa de alto desempenho para usos que não requererão os carros, não seria melhor? Não é esta a revolução que queremos?”.

Ao que tudo indica, os debates continuarão acalorados por um bom tempo. Todos parecem concordar, no entanto, que essas discussões devem ser feitas ao lado da população. Resta saber, todavia, se as audiências públicas previstas ao longo da revisão do novo Plano Diretor Estratégico de São Paulo serão suficientes para sanar essas demandas.

 

*** As conferências do 6º módulo do Projeto Repórter do Futuro sobre São Paulo são realizadas no auditório Freitas Nobre na Câmara Municipal de São Paulo e podem ser acompanhadas online pelo site http://www.camara.sp.gov.br. Ao longo do curso, os futuros repórteres possam a adquirir ferramentas para analisar e pensar a cidade. Além dos encontros com jornalistas, cronistas e especialistas dos principais indicadores da realidade, o curso traz ainda aulas bônus com técnicas de estudo, revisão de conceitos do jornalismo e RAC – Reportagem com Auxílio do Computador.