O cenário audiovisual nacional é rico em narrativas e cenas marcantes, que refletem a sociedade e levantam questionamentos, muitas vezes, atemporais. Com o apoio de Marco Vale, diretor da Faculdade Cásper Líbero e documentarista audiovisual, separamos 3 cenas de filmes que marcaram o cinema brasileiro. Confira!
“Convido aos jovens cinéfilos a conhecer a rica história do cinema brasileiro através de imagens marcantes de três filmes fundamentais.”
Três pessoas em um barco à deriva. Essa é a premissa de “Limite”, de Mário Peixoto, lançado em 1931. Na narrativa, os personagens relembram o passado por meio de flashbacks enquanto a situação no barco piora gradativamente. O filme é considerado um clássico do cinema brasileiro e em 2015, a Associação Brasileira de Críticos de Cinema classificou “Limite” como o melhor filme brasileiro de todos os tempos.
A cena em destaque acontece nos minutos iniciais do filme e mostra mãos algemadas. Em seguida, a imagem é substituída pelos olhos de uma personagem. Então, o rosto se torna um mar revolto que reflete a luz do sol. Marco Vale explica o questionamento que a sequência traz:
“Com estas imagens, Peixoto nos lança a seguinte pergunta: será que o que conseguimos ver no cinema dá conta da vastidão de nossos sentimentos?”
Eldorado, um país fictício da América Latina, é o cenário de “Terra em Transe”, de Glauber Rocha, diretor indicado ao Festival de Cannes em 1967, com o lançamento do filme. A narrativa acompanha o jornalista e poeta Paulo Martins em meio à luta de forças políticas por poder no país.
Em determinado momento do filme, uma personagem diz “a política e a poesia são demais para um só homem”. Na imagem final da obra, a tela é quase toda tomada por nuvens que anunciam uma forte tormenta no céu. Enquanto isso, o agônico protagonista do filme surge bem distante e lentamente no canto do enquadramento. Martin Scorsese, diretor de clássicos do cinema norte-americano como “Taxi Driver” e “Touro Indomável” e grande admirador de “Terra em Transe”, traduz essa imagem da seguinte forma:
“Diante de toda injustiça, sempre haverá resistência.”
Com 4 indicações ao Oscar (Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Edição e Melhor Fotografia), “Cidade de Deus”, de Fernando Meirelles, é uma importante referência do cinema brasileiro. Lançado em 2002, o filme mostra, sob a perspectiva de Buscapé, o surgimento do crime organizado na favela Cidade de Deus, um dos lugares mais violentos do Rio de Janeiro.
O final do filme também é uma imagem de destaque. Nela, Buscapé registra a morte de Zé Pequeno, chefe do tráfico na Cidade de Deus, com uma câmera fotográfica. Marco Vale explica a importância da cena:
“Através da captura das imagens da realidade brutal que o cerca, Buscapé tem a chance de escapar do determinismo social que ceifa as vidas de todos os outros personagens que se envolvem no ciclo de violência inerente ao tráfico de drogas.”
O diretor da Faculdade Cásper Líbero reforça a importância de analisar os filmes nacionais:
“Entre o sonho, o delírio e a realidade, “Limite”, “Terra em Transe” e “Cidade de Deus” fazem parte do seleto grupo de clássicos do cinema mundial. Assistir, refletir e debater sobre estas três obras-primas é a oportunidade de participar da rica e complexa cultura audiovisual brasileira.”