Washington Ramos Filho, mais conhecido como Neno Ramos, é um dos artistas brasileiros mais renomados da atualidade. Integrante do movimento pop art, é conhecido pelos seus trabalhos “Rosas Carimbos” e “Mona Lisa no Brasil”. Sua carreira artística teve início quando já adulto, o que não impediu a construção de um nome reconhecido internacionalmente. Já expôs no Salão da Sociedade Nacional de Belas Artes no Carrousel du Louvre, recebeu o diploma de Medalha de Vermeil da Sociedade Acadêmica de Artes, Ciências e Letras da França e trabalhou em parceria com outro grande nome da arte brasileira, Antonio Peticov.
Como surgiu seu amor pela arte?
Vem desde sempre. Eu só não achava que me tornaria artista. Não acreditava que “artista” fosse uma profissão digna ou que desse retorno financeiro. Meu pai queria ter um filho engenheiro e eu achava que não podia dizer para ele que gostaria de ser artista plástico. Hoje pode ser diferente, mas naquela época, anos setenta, o artista plástico “vive em outro mundo, não trabalha, não ganha dinheiro e é coisa de bicha”. Então eu fiz arquitetura. Enfim, a arte já estava comigo desde criança, eu só não conseguia assumi-la.
Como seu pai reagiu a essa escolha?
Levou na boa. Ele queria que eu fosse engenheiro por ter uma empresa de construção. Já eu, achava que arquitetura tinha muita arte ligada. Mas quando ele encontrava com amigos, dizia que eu estava fazendo engenharia. Para ele, era tudo a mesma coisa. Eu fiz arquitetura e urbanismo e já tinha feito edificações no colegial. Para o que ele fazia, loteamentos, isso vinha a calhar.
Apesar de ter feito arquitetura, o senhor não trabalhou exatamente nessa área. Por que isso aconteceu?
Meu pai faleceu, eu tinha quatro irmãs e acabei assumindo a empresa. Algumas delas podem até ser mais competentes administrativamente do que eu, mas nenhuma queria trabalhar com aquilo. Como eu já sabia tecnicamente o funcionamento…
Você conseguiu ser feliz nesse meio tempo?
Não. Passei por vários planos econômicos até que chegou uma hora que eu disse: “Quer saber? Isso não está me dando nem dinheiro nem prazer”. Depois eu perdi uma irmã com quem tinha muita ligação. Existem momentos na vida que ela te joga lá no chão. E aí vem alguém e ainda pisa. Justamente nesse momento, eu percebi que não tinha mais nada a perder. Falei com um sócio e perguntei: “Já pensou em fazer outra coisa da vida? Eu penso. Vou ser artista definitivamente”. Hoje, eu não tenho quem dependa de mim, não dependo de ninguém, moro sozinho… É meu momento. Quando ela morreu, percebi que ou eu fazia agora o que amava, ou talvez nunca mais tivesse a oportunidade. Larguei tudo sem dinheiro, morando de aluguel, sozinho e de coração partido. Mas toquei minha vida e me reergui com isso. Quando você faz aquilo que você ama e coloca até suas entranhas nisso, não tem como dar errado. Se você tem verdade ali, acontece.
Quais foram os maiores obstáculos no começo da carreira?
Tudo. Vendia muitos quadros por pouco. No começo, nem a sua família acredita. Te julgam um perdido na vida por deixar de ser algo para se tornar outra coisa. Raros foram os amigos que compraram as minhas obras.
Seu nome verdadeiro é Washington Ramos Filho. Por que a escolha de “Neno” Ramos?
“Neno” surgiu antes da carreira artística, quando eu nasci. Eu tenho três irmãs mais velhas e costumavam dizer a elas que nasceria um nenê. Mas, minha segunda irmã achava que “nenê” estava no feminino e que “neno” era o masculino. E aí pegou. Como meu pai era Washington, eu me vejo mais como “Neno”.
Como funciona o processo criativo para você?
Tiro minhas referências do dia a dia. Às vezes acordo de madrugada já com ideias na cabeça, às vezes as encontro no silêncio da meditação. Todo sábado, eu escuto uma palestra sobre o evangelho. Há dez anos, eu não acreditava que acordaria aos sábados de manhã para ouvir essas passagens, mas me faz bem. Ultimamente, isso só me traz ideias.
Alguns de seus trabalhos mais famosos são as séries de quadros da Mona Lisa em diferentes
cenários. Por que a escolha da Mona Lisa e por que trazê-la ao Brasil?
Acho que a Mona Lisa me escolheu. Um dia, no ateliê, uma cliente me pediu uma Mona Lisa pop. Enquanto fazia, comecei a me perguntar sobre o cenário. Assim me veio a ideia de fazê-la em cenários brasileiros. Com elas eu fui recomendado pelo “Regard Sur” e expus no Salão da Sociedade Nacional de Belas Artes no Carrousel du Louvre. Com isso, conheci o Lula ao presenteá-lo com uma Mona Lisa no jogo do Corinthians. Disse ao presidente: “Agora está homologado: a Mona Lisa é corintiana!”.
Qual sua opinião sobre essa junção da arte com a tecnologia?
Se eu quiser ser um grande pintor, com pincel e tinta, ou um grande desenhista, eu consigo daqui cinco anos. Mas não é isso que me interessa hoje. Acho fantásticos os artistas que fazem isso… Eu fui por outro caminho. Enferrujei meu desenho e pintura para partir para a tecnologia, que é o que me encanta: bolar coisas que as pessoas ainda não fizeram. Marchetarias de acrílico, por exemplo, só eu estou fazendo no mundo.
Como o senhor vê a arte no Brasil? Atualmente, é possível viver disso?
Você tem que ser bem articulado. Fazer ECA ou FAAP, pois os grandes curadores de hoje saem dessas faculdades. Infelizmente, são eles que ditam a arte atualmente, são os formadores de opinião. Há também muitos bons artistas que não são conhecidos, mas que talvez um dia suas obras valorizem. Acho que as portas estão se abrindo mais facilmente lá fora do que aqui dentro.
O que o move a seguir na carreira artística?
Antes, eu queria ter muito dinheiro para não trabalhar nunca mais. Hoje eu penso o que faria se não trabalhasse nunca mais. Eu continuaria fazendo arte. Ela não é trabalho, é prazer. Então, eu faria isso para o resto da vida. O que me move é o tesão de ver a coisa pronta. A arte me move – o resultado dela. Eu não me vejo fazendo outra coisa. Até me vejo, mas não tão feliz.