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Crédito: Giulia Granchi

Crédito: Giulia Granchi

Gênero jornalístico por excelência, a reportagem compõe páginas de revistas, colunas de jornais e programas televisivos. Todavia, há a “Grande Reportagem” com conteúdo aprofundado, muita apuração e um olhar diferenciado sobre certo tema, que pode resultar em milhares de caracteres ou horas documentais. Livros como Rota 66, de Caco Barcellos, Quarto de Despejo: Diário de uma favelada, de Audálio Dantas, ou o icônico A sangue frio, de Truman Capote, são exemplos de grandes reportagens. No 3º dia da Semana de Jornalismo, evento da Faculdade Cásper Líbero, houve a mesa “Grande Reportagem: momentos decisivos”, mediada pelo professor Sergio Vilas-Boas e com a participação de Domingos Fraga Filho, da Record; Paulo Tadeu, da Editora Matrix; Alexandre Versignasse, da Revista SuperInteressante; Guilherme Belarmino, do programa Profissão Repórter, da TV Globo, e Audálio Dantas, escritor de diversos livros e ganhador do Prêmio Jabuti.

Vilas-Boas iniciou a discussão apontando para a falta de grandes reportagens e se é possível imaginá-la nesse mundo tecnológico tão disperso e cheio de opiniões. Assim, ele propõe a seguinte pergunta para os participantes e a audiência: “O gênero reportagem especial está acuado?” As respostas, envolvidos com questões profissionais de cada um dos palestrantes, discorriam sobre quatro focos principais e interligados, o tempo, dinheiro, espaço e internet.

Audálio Dantas, jornalista premiado este ano com o troféu Comunique-se e um “velho repórter” – como ele mesmo se definiu – crê que a reportagem especial está quase extinta devido aos novos meios tecnológicos. Afinal os jornais tentam competir com a internet e promover o imediatismo das notícias. Dessa maneira, há um enxugamento das matérias, tempo e pessoas, além de uma falta de apuração, que afeta diretamente na credibilidade do jornalismo e no interesse do leitor/espectador pelo conteúdo. Um atuante repórter da emblemática revista Realidade, onde havia um investimento efetivo nas grandes reportagens e edições especiais – jornalistas passavam de três a quatro meses apurando e pesquisando em campo –, Dantas comenta que o momento decisivo de uma matéria é quando se está cobrindo um assunto cotidiano e se consegue perceber nele uma excelente história. Além disso, ele falou que as grandes reportagens migraram para os livros, exatamente pela falta de espaço nos jornais e revistas.

Seguindo essa linha de pensamento sobre o livro-reportagem, o editor da Matrix, Paulo Tadeu, conta que o primeiro best-seller de sua editora foi justamente sobre a personagem televisiva Chávez. E era um TCC de um estudante de jornalismo. Para ele, os livros publicados devem conter projetos diferentes e relevantes, como Eike – A Derrocada do Homem mais Rico do Brasil, de Felipe Moreno. Tadeu acrescenta que “cabe a nós (jornalistas) nos preocuparmos com o diferente, pois de superficialidade o mundo está cheio”.

Antigo professor da Cásper Líbero, Domingos Fraga Filho trabalha hoje no R7, portal online da Record, e durante o encontro dialogou principalmente sobre a influência da internet nessa questão. “Na internet, há pouca reportagem especial, porque acham que tudo precisa ser ou preto, ou branco”, disse sobre os posicionamentos firmes e claros, geralmente dos colunismos opinativos. Falou ainda sobre o mito de que as pessoas não perdem tempo para ler textos online. Fraga Filho considera também que a função do jornalista é a investigação, por isso um investimento em grandes reportagens é essencial para surpreender, impactar e informar – três coisas que estão sendo deixadas de lado na busca pela rapidez e economia de tempo e dinheiro.

O jornalista Alexandre Versignasse, formado pela Cásper Líbero, editor da revista da Superinteressante, aproveitou os temas abordados por Fraga Filho sobre a internet e contou sobre uma experiência da revista: eles publicaram uma longa reportagem, de 40 mil caracteres, no site e esperaram para checar se tinha repercussão. O resultado foi que a matéria teve 120 mil likes e 500 mil visualizações, demonstrando que um conteúdo bem feito pode sim atrair leitores online. Além disso, seu livro-reportagem “Crash”, publicado pela Ed. Leya, que explica a crise econômica de 2008, mostrou como o mercado editorial pode ser uma opção significativa para os jornalistas.

“Fugir do jornalismo diário dentro do jornalismo diário” foi uma das colocações de Guilherme Belarmino, um ex-casperiano que hoje trabalha no Profissão Repórter da Rede Globo, ao lado de Caco Barcellos. Belarmino falou que “a grande reportagem” aparece todos os dias, mas depende muito do olhar do jornalista e de como ele vende essa possibilidade e proposta numa reunião de pauta de como a obter um investimento para produzi-la. Questionado sobre o distanciamento de repórter e personagem da matéria, ele disse que é preciso uma boa preparação e delimitação de quem é o entrevistado, qual sua situação atual e estabelecer uma relação de confiança, mas tentar não se envolver demais e nem ser muito frio.

Para concluir a mesa, Alexandre Versignasse disse que o jornalista deve sair do óbvio, e lutar pela exclusividade de informação, o furo de notícia é maravilhoso, mas a exclusividade de raciocínio e criatividade também são essenciais. Guilherme Bergamino adicionou que a ferramenta de um bom trabalho é o senso crítico e ter a mente aberta, pois as reportagens estão em detalhes imperceptíveis. Audálio Dantas (que tem em seu currículo a brilhante passagem pela presidência do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, com atuação decisiva no caso Vladimir Herzog), finalizou o encontro com sábias palavras: “Nem toda ‘Grande Reportagem’ é uma reportagem grande”, no sentido de que um bom conteúdo vale mais que milhões de caracteres.