Nenhuma profissão no mundo é completamente fácil de exercer, no entanto, algumas são mais complicadas que outras, principalmente quando se envolve o preconceito. Fabiola Cecon foi modelo internacional durante muitos anos de sua vida, começou muito cedo na carreira, assim vivendo todas as alegrias e as tristezas que a profissão envolve. Hoje, com 46 anos, é casada e tem duas filhas, mora no Brasil e afirma que não trocaria sua vida de hoje para voltar a ser modelo.
1- Você começou sua carreira de modelo com quantos anos exatamente?
Fabiola: Eu tinha entre dezesseis e dezessete anos.
2- Era uma coisa que você tinha planejado fazer da vida?
F: Não, eu nunca planejei, nunca pensei em ser modelo. Era uma coisa muito diferente pra mim. Na verdade, foi uma oportunidade que surgiu e eu acabei trabalhando com isso.
3- Se não foi uma coisa planejada, como você entrou nessa profissão?
F: Na época eu era bailarina e o meu sonho era dançar em uma companhia de ballet fora do país, só que eu não tinha uma condição financeira que me ajudasse a estudar ballet da forma que eu queria. Eu vim de uma família humilde, meu pai não tinha condição de pagar vários cursos de dança, então eu ia atrás de testes para bolsa de estudo. E com o passar do tempo, eu consegui chegar num nível profissional legal. Naquela época, a gente fazia muita coisa, as bailarinas trabalhavam muito com coisas de modelo também. Muitos clientes não queriam só uma modelo, eles queriam uma menina que em algum momento pudesse fazer algo diferente, dançar, por exemplo.
Só que chegou uma época que um sindicato “caiu em cima” com novas leis, e decidiram que só se podia trabalhar como modelo ou bailarina quem tivesse um registro. E pra tirar um registro de bailarina era muito difícil, tinha que ter uma comprovação de trabalho com bilheteria e essas coisas, e eu não tinha como comprovar isso. Então era mais fácil tirar registro como modelo e eu poderia continuar atuando como bailarina também. E foi isso que eu fiz, continuei fazendo trabalhos com a dança. Mas, depois de um tempo, eu tive um problema de saúde que me fez parar de dançar. E a partir daí, começaram a surgir outras oportunidades de trabalho como modelo e eu comecei a trabalhar muito com isso, acabei indo para o Japão e entrei sem querer no mundo da moda, não foi uma opção.
4- E seus pais a apoiaram nessa sua escolha ou ficaram contra em algum momento?
F: No começo, o meu pai não gostava muito, porque já tinha aquele preconceito de que modelo é quase uma garota de programa, então ele ficava preocupado. Mas ao longo do tempo ele foi vendo o meu trabalho e confiou naquilo que eu estava fazendo.
5- E como você foi convidada a morar no Japão?
F: Essa viagem também foi uma questão de oportunidade. Teve uma época no Brasil que todo modelo ia pro Japão, era uma moda, e obviamente eu queria ir também. Só que eu estava começando a carreira, eu não tinha uma agência, que era quem mandava as modelos para fora. E como eu queria muito, um amigo meu que foi para o Japão levou umas fotos minhas, e depois de um tempo uma das agências me mandou uma carta falando que queria me contratar. E eu fui literalmente com a cara e a coragem, porque não tinha dinheiro nem para pagar a passagem, quem pagou foi a própria agência.
6- Foi difícil pra você no começo, ainda mais longe dos seus pais?
F: Foi muito difícil, eu passei muita necessidade, passei fome… Foi bem complicado porque eu mal falava inglês, não falava japonês, e o custo de vida no Japão é muito alto e eu viajei com pouco dinheiro. Então no começo, eu só chorava, mas eu sempre fui muito persistente, quis me arriscar e continuar.
7- As pessoas no Japão têm uma cultura muito diferente da nossa, principalmente a língua que é falada. Você se acostumou com esses hábitos ou sempre sentiu falta do “jeitinho brasileiro”?
F: Eu me acostumei e gosto muito do Japão até hoje, eles têm uma cultura linda. Eu acho que foi isto que me confortou em ficar lá, as pessoas são superacolhedoras, eles faziam de tudo para agradar ou ajudar os estrangeiros. Então eu sentia falta só da minha família, não do Brasil em si.
8- Você sofria muito com o preconceito das pessoas pela profissão?
F: Sim, sofria. Até hoje as pessoas acham que para você ser modelo, precisa estar sempre muito bem vestida, arrumada… Se você sair desse padrão de comportamento, as pessoas acham estranho, sabe? Eu era julgada o tempo todo, pelo meu jeito de vestir, de andar, minhas atitudes, até porque eu que fazia minha própria moda, não tinha dinheiro pra ficar me autoproduzindo. E além disso, tinha aquele preconceito de que toda modelo era garota de programa, e eu nunca fui assim, mas era difícil conviver com isso o tempo todo.
9- Por que você desistiu da carreira de modelo?
F: Eu nunca sonhei em ser modelo, eu trabalhei bastante, fiquei quatro anos lá, mas é um mundo extremamente competitivo, um mundo muito “podre”, onde todo mundo “passa a perna” em todo mundo. E eu estava cansada disso, além de que eu não podia fazer nada e nem tomar nenhuma atitude que a agência não aprovasse, eles que falavam o que eu devia ou não fazer, meus horários e até os lugares que eu ia. E eu comecei a ficar aborrecida, então eu voltei pro Brasil, acabei conhecendo meu marido e nunca mais voltei.
10- Muitas mães, quando já tiveram uma carreira tão especifica como ser modelo, desejam que sua filha pelo menos tente o mesmo caminho. Em algum momento isso aconteceu com você após virar mãe?
F: Não, pelo contrário! Por tudo que eu passei, por eu saber como é competitivo esse mundo, eu diria para minhas filhas que não é uma carreira que eu sonharia pra ela. Claro que se elas quisessem seguir essa profissão eu iria apoiar, mas não seria uma vontade minha. Até porque ser modelo é uma questão de sorte, de estar na hora certa com as pessoas certas.