Ela não filma ou tira fotos de catadores de batatas e em seguida vai para casa editar as imagens coletadas. Ela colhe batatas junto com os agricultores, conversa com eles sobre o trabalho que fazem e, para além de um purê, termina levando as batatas que mais gostou. Então, monta uma exposição e fotografa os momentos de vida e morte das batatas, brinca com seus formatos e explora seus ângulos. Não à toa seus olhos, ainda que doentes, descobrem personagens fortes para seus roteiros: feministas, viúvas, judeus, refugiados, sem-teto, que por sua vez se transformam em obras de arte que ela também cria a partir de ou para seus documentários.
É assim que Agnès Varda trabalha. Seu último filme, aos 90 anos, em que ela faz um pout pourri da sua trajetória cultural, não poderia ser interpretado por outra atriz senão ela mesma. Tudo orna e ao mesmo tempo contrasta no filme: a trilha sonora vibrante e a predominante plasticidade das cores, como o texto em monólogo, são intercaladas pelas cenas com os diferentes profissionais com quem ela também se confunde artisticamente para produzir Varda por Agnès.
Saio sem saber: cineasta, roteirista, fotógrafa, artista plástica ou poeta? Multimidiática. Uma aula de arte. Como as batatas, ela se apresenta de várias formas, inusitadas, e nos alimenta por duas horas; uns se vão, mas os que ficam são premiados pela última cena em que ela se esvai nas areias da praia que levam para o mundo as pegadas da sua obra.