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Edição nº zero – 2013

O curador Tobi Maier acompanha na Av. São João o churrasco de bode oferecido pelo artista Thiago Gonçalves

O curador Tobi Maier acompanha na Av. São João o churrasco de bode oferecido pelo artista Thiago Gonçalves

“Não estou necessariamente interessado em explorações formais, mas sempre procuro o diálogo com os artistas sobre os momentos políticos e sociais que atingem as nossas vidas, que são eminentes dentro do discurso e dos acontecimentos no Brasil contemporâneo”. Se o discurso da arte contemporânea parece impenetrável ao grande público, Tobi Maier, curador, crítico de arte e ensaísta alemão radicado em São Paulo, propõe mostras simples e transparentes, que incorporam a arquitetura original do espaço expositivo e buscam revelar os “segredos” dos artistas e suas obras. Em paralelo, organiza “atividades discursivas”, que envolvem publicação de textos, encontros e debates com os artistas, além da colaboração interdisciplinar. Tudo em nome do diálogo entre a arte, o artista, a instituição e o público – “O papel fundamental do curador hoje é escrever e comunicar”, diz.

Curador inquieto com seu tempo, Maier tem buscado contribuir para o desenvolvimento das instituições na contramão do boom das galerias. “Tanto quanto temos um mercado muito forte em São Paulo, temos instituições muito fracas”, avalia. Maier não mede esforços para tentar uma reflexão sobre o atual panorama cultural brasileiro, cujos mecanismos de incentivo financeiro estão antes de tudo voltados ao entretenimento. “Sou alemão, moro aqui e também não estou entendendo tudo o que vejo”, diz.

Para Maier, o contexto social é um campo importante para se trabalhar dentro da curadoria. Com olhar crítico, lamenta ignorar artistas indígenas e afrodescendentes. Num pais como o Brasil, a arte contemporânea deveria refletir as realidades e mesmo as mazelas da sociedade. “Cresci na numa Alemanha pós-guerra, antes da queda do muro. Cresci com os marroquinos, turcos e italianos, filhos da primeira onda de imigração. De certa forma, isso me impactou. Acho que é nossa responsabilidade como cidadão de uma democracia reconhecer os direitos das minorias”.

Maier tem consciência de viver numa cidade à parte do Brasil. Vive regularmente em São Paulo desde 2011, quando passou a atuar como curador associado da Trigésima Bienal. Já havia trabalhado na capital em 2002, junto ao Goethe-Institut, e em 2006, quando foi curador interno da 27ª Bienal. Nesse meio tempo, exerceu a curadoria da Frankfurter Kunstverein, colaborou com a Manifesta 7, na Itália, e trabalhou no Ludlow 38, espaço cultural do Goethe-Institut para arte contemporânea em Nova York, entre outras instituições. Tem colaborado com uma série de jornais, como o Untitled, Exit Expresse Art-Agenda, além de estar à frente de importantes publicações, como a Extra-disciplinary spaces, and de-disciplinizing moments (in and out of the 30th Bienal de São Paulo), OEI, Suécia, 2013.

No final de 2013, apresentou em São Paulo as individuais do artista e ilustrador paulistano Marcelo Cipis, na FUNARTE, e do artista mineiro Alexandre Brandão, na Oficina Cultural Oswald de Andrade – não por acaso dois espaços localizados no centro da cidade. Atualmente, seu campo de investigação trata das procissões e desfiles no contexto da arte contemporânea. Entre outras atividades, divide com os suecos Jonas (J) Magnusson e Cecilia Groenberg uma pesquisa sobre o “Poema Processo”, movimento surgido em Natal e no Rio de Janeiro no final dos anos 1960 em reação à Poesia Concreta de São Paulo.

Hoje, a arte contemporânea tem muito mais concorrência frente às novas realidades virtuais, como as redes sociais e ambientes digitais. Por outro lado, Maier vê a visita ao museu como uma atividade complementar, “uma experiência mais real, o corpo dentro do espaço, enfrentando uma produção física em vez de só digital”.
Apesar de um público qualificado poder gerar crítica e discussão, Tobi Maier avalia uma necessidade de visitantes espontâneos às mostras, diferentes daqueles incentivados pelos departamentos educativos das instituições. Tendo em vista o tamanho da cidade, o público paulistano ainda é muito pequeno. Diferente de cidades como Londres ou Nova York, São Paulo não conta com um número significativo de turistas que incorporem os museus aos seus roteiros de viagem. Também com relação à frequência, no contexto de uma multiplicação de galerias e feiras de arte, Maier percebe um público novo rico se engajando com o meio, “mesmo que seja para fazer investimentos”.

Para esta conversa sobre a arte contemporânea na capital paulista, Tobi Maier recebeu Arruaça em seu estúdio, na residência artística da FAAP – Fundação Armando Álvares Penteado, na Praça do Patriarca, coração da cidade. “A praça mudou bastante”, constata Tobi, folheando o livro “Algumas Exposições Exemplares: as salas de exposição na São Paulo de 1905 a 1930” (Zouk Editora, 2011). “Aqui, olhando para a janela, à esquerda, havia um dos lugares Avant-garde para mostras de arte no início do século 20, o Mappin Stores, que não é aquela loja conhecida em frente ao Theatro Municipal, mas um outro prédio na própria Praça do Patriarca. O que resta hoje em dia, provavelmente seja este edifício onde a gente está e a Igreja [de Santo Antonio], em frente à minha casa. Os outros prédios foram remodelados. Este lugar faz parte do triângulo histórico [Sé – São Bento – São Francisco]. Muitos artistas começaram a mostrar aqui antes da chegada do MAM e do MASP, em lojas de departamentos”, constata. O livro de Rejane Cintrão (que trata do efervescente meio das artes plásticas de então, com cerca de 40 mostras ao ano), contrasta com os dias atuais, quando chegamos à impressionante cifra de mais de 40 mostras ao mês.

Acompanhe abaixo uma edição dos melhores momentos desta entrevista, pontuada com samples do álbum “São Paulo Confessions”, de Suba.

 

 

 

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