Por André Ribeiro
No ano de 2023, Sérgio Andreucci, professor da pós-graduação em Comunicação Organizacional e do curso de Relações Públicas da Faculdade Cásper Líbero, finalizou e defendeu uma tese de doutorado sobre sua área de atuação, Relações Públicas e análise de riscos. Logo foi convidado pela Aberje, Associação Brasileira de Comunicação Empresarial, à publicação de seu estudo em forma de livro. A obra “Riscos de Comunicação. A relevância da gestão de identidades nas Relações Públicas” é resultado da experiência profissional e das reflexões acadêmicas do autor na sua trajetória de mais de três décadas na comunicação.
Na entrevista concedida ao Pós na Cásper, Sérgio nos revela um pouco mais da sua vivência na profissão, fala sobre o processo de transformar uma tese em livro, explica suas ideias a respeito da importância e o impacto do profissional de comunicação para a imagem de empresas e dá dicas sobre gerenciamento de riscos.
Bom, na verdade o resultado dessa tese e, logicamente, desse livro, foi um resumo da minha vida profissional, porque há pouco mais de 30 anos que eu trabalho com gestão de crises e riscos, principalmente em relacionamento com populações atingidas por barragens de usinas hidrelétricas, minha carreira toda foi em empresas do setor elétrico.
Eu comecei como estagiário na Companhia Energética de São Paulo, e de estagiário fui para Relações Públicas, fui gerente de comunicação. A Companhia Energética de São Paulo era a principal empresa de energia de São Paulo e a segunda maior do Brasil, nós tínhamos 23 usinas hidrelétricas, entre usinas prontas e usinas que estavam sendo construídas. O meu papel era justamente fazer a aproximação da empresa com os públicos atingidos por barragens. A minha história começa aí.
Depois que eu saí da empresa e montei a minha agência, eu continuei atendendo projetos desse segmento. Eu trabalhei em Belo Monte, trabalhei em Santo Antônio, trabalhei em Jirau, e trabalhei também em projetos no Porto de Santos, projeto no Porto de Ilhéus. E sempre nessa questão de gerenciamento de riscos e crises. Meu último trabalho de gerenciamento de riscos foi pela Rede Maristas de Ensino, que tem escolas no Brasil inteiro.
Não tem diferença. Na verdade, a Aberje se interessou pelo tema. Eles viram a minha tese, entraram em contato comigo e fecharam um contrato para a produção do livro.
Eles têm os direitos do meu livro. Então, o que eles fizeram? Eles pegaram a minha tese e a editaram. Apesar do livro ter 334 páginas, a tese era um pouquinho mais robusta, então demos uma enxugada na tese, eles editaram para virar livro, na versão impressa e na versão e-book, mas é exatamente a mesma tese.
Bom, a primeira sugestão é ler meu livro. Modéstia à parte, é o único livro que fala de gestão de riscos em comunicação. Não há nenhuma bibliografia falando de gestão de riscos. As bibliografias que nós temos na área falam de gestão de crises.
O que acontece? Os profissionais de comunicação, tanto em Relações Públicas quanto assessores de imprensa, são sempre chamados na hora que o circo está pegando fogo, ou seja, quando a crise ou já aconteceu ou ela está na iminência de acontecer. Aí é uma situação que nós não sabemos ao certo o que vai acontecer, porque você sabe como a crise começa e acontece, mas você não sabe como e quando ela termina, e quais serão os resultados.
Os resultados são imensuráveis, muitas vezes devastadores para a empresa, para a marca e para a imagem. Quando você fala em trabalhar com risco, você tem que trabalhar em cima dos sinais, das anomalias que a empresa tem.
A empresa apresenta muitos sinais em várias áreas, então você tem que fazer o mapeamento desses sinais, o mapeamento dessas anomalias, e trabalhar preventivamente com os riscos. Tudo tem risco. Você sai na rua, você tem risco. Todas as empresas e produtos têm risco.
O mapeamento de risco vai desde o insumo até a pós-entrega de tudo, tanto de produto quanto de serviço. Quando o risco foge do seu controle, se torna inerente, esse risco passa a ser tratado de uma outra maneira. Mas se você conhece os seus riscos, você se blinda e aprende a lidar com eles.
Agora, como é que o profissional de comunicação pode conhecer esses riscos?
Ele tem que fazer parte do processo. Ele não pode ficar escondido e fechado dentro do seu casulo da comunicação. Ele tem que se aproximar da administração e dos processos produtivos, porque ele tem que conhecer onde estão os gargalos da comunicação, que não estão necessariamente só na comunicação, estão na produção.
Dentro da produção a gente tem o que a gente chama de comunicação administrativa. Hoje, a comunicação administrativa quem cuida, por exemplo, é o TI, Tecnologia da Informação.
Estamos falando de inteligência artificial, de URA (Unidade de Resposta Audível, ferramenta de atendimento eletrônico capaz de reconhecer comandos de voz e sinais), de internet e de todos os procedimentos eletrônicos de formulários que uma organização tem. Isso é comunicação administrativa.
Essa burocracia do TI pode gerar uma série de problemas; já mapeamos que existem muitos problemas na comunicação administrativa.
E como é que você faz isso?
Bom, se o profissional de Relações Públicas, de imprensa, seja qualquer outro profissional de comunicação, não se integrar aos processos, não der um passo atrás e entender como é que funciona a produção de produtos e serviços, ele não vai, de maneira nenhuma, conseguir gerenciar riscos, porque o risco a gente gerencia na essência, no DNA, no seu início. Gerenciando riscos, você elimina uma série de possibilidades que eles agravam e, consequentemente, antes de virarem crises.
É assim que a gente faz.
Como eu falei agora na última questão, sobre a gente se antecipar e participar do processo como um todo, conhecendo a produção de produtos e serviços, desde o insumo até o pós-entrega. A comunicação precisa sair do casulo e tem que se integrar à administração para conhecer tudo isso. Quando a gente fala de identidade, de cultura, é exatamente isso.
Como é que você muda a imagem de uma empresa?
Faz uma campanha publicitária? Muda a logomarca? Muda a cor? Faz um folder, um blog, um site? Não é isso. Tem que mudar a identidade para gestão de risco.
Você tem que discutir missão, visão, valores, você tem que discutir competências. Porque não basta a empresa, a organização, dizer o que ela faz, a empresa precisa comprovar como ela faz, e se ela não muda a sua essência, e a sua essência está na sua identidade, na sua cultura, no seu jeito de ser, ela não vai conseguir mudar a sua imagem.
Então, não adianta fazer perfumaria, para você realmente trabalhar com a raiz, você tem que dar um passo atrás e trabalhar com a essência, mudar comportamento, mudar cultura.
Isso aconteceu na Lava Jato, a Petrobras fez o seu trabalho, criou uma diretoria de compliance, trabalhou todas as suas políticas, mudou as suas políticas, mudou a diretoria para que ela pudesse ter confiabilidade no mercado, para que esses riscos não virassem novas crises como viraram no passado. Outras empresas fizeram isso, a Odebrecht, por exemplo, fez, só que ela demorou demais.
Quando a gente fala de trabalhar o risco com identidade, com cultura, essência, é trabalhar a sua política. A sua política é o modo de agir, não é só a propaganda, a imagem que você projeta, você tem que fazer a lição de casa. Então, o que adianta você mostrar algo que você não é? Isso não é verdadeiro. Você pode tentar projetar uma imagem que não é sua, isso pode até dar certo durante um tempo, mas isso não se suporta por si só.
Portanto, a condição de construção de identidade, de conceito, de cultura, é essencial para estruturar a política. Estruturando as políticas da empresa, você consegue mudar o comportamento. Mudando o comportamento, você muda sua imagem.
O gerenciamento de riscos, na minha opinião, é a principal salvaguarda para imagem e reputação das empresas. Porque se a gente trabalhar com gerenciamento de riscos, a gente vai trabalhar possíveis problemas na sua raiz, fazendo com que esses problemas não virem crises.
A gestão de riscos é barata. Ela é chata, porque ninguém quer fazer. Trabalhar minuciosamente em todos os riscos como eu disse, do insumo até a pós-entrega, trabalhar minuciosamente com esses riscos, porque nós temos riscos de comunicação.
No meu livro eu abordo o mapeamento dos riscos de comunicação, que são muitos, mas a gente conhece os riscos de engenharia, os riscos de produção, os riscos comerciais, os riscos trabalhistas, os riscos jurídicos, existem muitos riscos. A gente está abordando só a comunicação. Ao fazer esse mapeamento de riscos e tratando esses riscos na raiz, além de ser um trabalho muito mais eficaz e barato, apesar de ser um trabalho diário e incessante, evita a crise.
A crise pode simplesmente comprometer o maior patrimônio de uma empresa que é o seu patrimônio reputacional, o seu valor reputacional, e isso pode acabar com a empresa no mercado, acabar com o seu valor de mercado, e acabar com as suas ações na Bolsa de Valores.
Enfim, por que você vai deixar a crise acontecer e chamar o profissional de comunicação só no momento da crise? Por que você não usa a sua inteligência e dá um passo atrás e trabalha com risco? Trabalhando com risco, você se blinda. Você evita as crises, e protege o seu maior patrimônio, que é a sua imagem e reputação.
Este conteúdo faz parte da Newsletter Pós na Cásper, uma iniciativa dos cursos de Pós-Graduação lato sensu da Faculdade Cásper Líbero, que informa e divulga as produções realizadas pelos estudantes que desejam aplicar o conhecimento adquirido em suas atividades profissionais nas organizações, ou querem realizar novos projetos, como transição de carreira ou inovação nas funções que já exercem. Iniciativas e perfis de docentes, além de agenda sobre eventos (como aulas magnas e abertas, mesas-redondas, oficinas, rodas de conversa, entre outros) também são o foco da publicação.
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