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Anna Carl Lucchese | Foto: Acervo pessoal

Ela queria estudar Cinema, mas poucas faculdades ofereciam o curso. Chegou a prestar vestibular para Relações Internacionais, Audiovisual e cogitou o curso de Jornalismo. Mas um funcionário do cursinho a alertou sobre um novo curso que a Cásper Líbero oferecia, e assim, em 2002, Anna Carl Lucchese ingressava na primeira turma de Rádio e TV da Faculdade Cásper Líbero.

Formada em 2005, fez pós-graduação em Direção Cinematográfica pela ESCAC (Escola Superior de Cinema i Audiovisuals de Catalunya) em 2007 e após alguns trabalhos na TV aberta, por meio de produtoras, foi convidada para dirigir o programa A Máquina, transmitido pela TV Gazeta.

Na 2ª Semana de Debates de Cultura Geral, Anna exibiu seu primeiro documentário longa-metragem, “Identidade Cotidiana”, em que acompanha o dia-a-dia de seis estrangeiros que escolheram São Paulo como moradia.

Em entrevista, ela fala sobre sua trajetória na Fundação Cásper Líbero, como aluna da Faculdade e, mais tarde, como funcionária da TV Gazeta, e conta como foi produzir e dirigir seu primeiro filme.

Julya VenditeVocê queria Cinema mas se formou em Rádio e TV pela Cásper. Você acha que o curso respondeu às suas expectativas?

Anna Carl Lucchese – Eu acho que qualquer faculdade que você faça no Brasil é preciso correr atrás, principalmente nesse curso. A faculdade te dá uma base de cultura geral, um conteúdo de várias outras áreas, mas a questão mais prática, mais técnica, especificamente, você precisa ter um espírito muito proativo, realmente correr atrás.

No 2º ano eu queria fazer um curta. Conversei com os professores, falei sobre o meu projeto, conversei com a Faculdade e eles me apoiaram para fazê-lo nas férias, e foi uma iniciativa minha. Então, eu vejo que se não houver um comprometimento do aluno, a faculdade não irá suprir todas essas questões.

JV –  Enquanto Casperiana, quais experiências marcaram seu período na Faculdade?

ACL –  O curta me marcou muito. Eu tive muito apoio dos professores e isso foi muito bom, me estimulou muito, foi um momento de imersão.

O estágio na Produtora Experimental (hoje conhecida como Clact Zoom) também me marcou. Fiquei um ano lá e comecei a aprender sobre edição, me aprofundei e isso se tornou minha profissão. Aprendi muita coisa com o professor Marco Vale e com outro monitor, porque propúnhamos muitas coisas diferentes. Tínhamos muita liberdade de experimentar.

Meu terceiro momento marcante foi o TCC com meu primeiro documentário, “Olhar Transeunte”. Foi uma experiência maravilhosa descobrir tudo o que eu descobri nesse processo. Pela primeira vez trabalhei com arte e política, pois abordei questões superimportantes, entrei em um universo muito diferente do meu, descobri uma cidade que eu não tinha contato. Saber a situação do morador de rua, a decadência do ser humano na cidade grande. A questão humana foi muito forte.

Eu acho que esses foram os três momentos que mais me marcaram na Faculdade.

JV –  Hoje você é diretora do programa A Máquina. Como enxerga a experiência de trabalhar aqui, no mesmo lugar em que você se formou?

ACL –  Nunca imaginei trabalhar aqui. Que louco, né? Eu não sei, eu tinha essa coisa com o Cinema, mas eu acabei não tendo experiência com isso. A experiência que você tem de estágio marca muito seu futuro.

Minhas experiências foram em produtoras pequenas, e isso realmente marcou meu futuro. Eu trabalhei produzindo conteúdo institucional, conteúdo para Internet, pequenas publicidades, eventos. Tive uma experiência na Band, fazendo conteúdo através de uma produtora. Depois eu fui contratada para trabalhar na TV Cultura em um projeto de educação que durou nove meses. Eu sempre fiquei nas produtoras, mas os caminhos foram se diversificando. Por conta disso eu não imaginava que fosse trabalhar em televisão, e hoje eu estou aqui.

JV –  Como você começou a trabalhar na TV Gazeta?

ACL –  O superintendente da Fundação criou o Núcleo de Criação, e, na época, os três diretores gerais do Núcleo eram Ross Salinas, Maurio Galera e Robson Valichieri. Após criarem o programa A Máquina, pediram indicações de um diretor para trabalhar especificamente no programa, e o professor Marco Vale passou o meu nome. Eu entrei em 2012, um mês antes da estreia. A experiência têm sido muito boa, aprendi muito aqui.

JV – Na 2ª Semana de Debates de Cultura Geral você exibiu seu primeiro documentário longa-metragem, o Identidade Cotidiana. Como surgiu a ideia do filme?

ACL – A ideia surgiu quando eu estava indo para a Espanha fazer o mestrado (…). Na época eu comecei a perceber as questões de identidade e, na volta, senti uma estranheza muito grande e precisei me adaptar novamente. Na Espanha eu não era brasileira, eu era paulistana, porque eu conheci outros brasileiros lá e a energia era outra, eles eram muito mais abertos, relaxados.

JV – E como foi falar de questões tão pessoais no filme?

ACL – Eu passei por um processo de adaptação, de aprendizado, de transformação ao entrar no programa A Máquina e isso tudo foi se refletindo na maneira que eu enxergava o tipo de trabalho que eu fazia até então, isso abriu minha cabeça para um leque de possibilidades maior (…). Com o programa eu voltei a desenvolver meus textos, porque tudo o que a Máquina fala sou eu quem escrevo. Percebi que esse lado menos literal e mais poético era parte de mim.

Eu passei um bom período pensando na melhor maneira de entrar com os meus textos no filme, foi um processo de luta interna, por receio mesmo. Eu acho que é difícil quando você se coloca no trabalho, até mesmo para se distanciar e analisar aquilo. Eu contei com a ajuda de outras pessoas porque há uma série de questões autocriticas que as vezes nem existem.

JV – No filme, como você mensura a sua relação com a cidade e com os personagens estrangeiros?

AVL – Foi difícil, porque eu realmente fui muito megalomaníaca. Eu quis colocar muita coisa em um filme só. Eu queria falar da minha relação com a cidade, mostrar o que era a cidade, contar a história de seis estrangeiros (que inicialmente eram dez personagens e viraram seis depois), e eu queria contar histórias complexas, que todas tivessem temas que pudessem uni-las, e também falar da questão da identidade. Tudo isso foi bem difícil no processo de edição, para poder mensurar o que eu iria mostrar mais.

JV – Você tem novos projetos em mente?

ACL – Tenho. Ele está muito novo e eu estou muito empolgada. Se chama “Por que viajo sozinha?”. Em determinadas férias eu decidi que queria viajar sozinha e resolvi fazer a trilha Inca. Caminhei quatro dias na floresta, algo que eu nunca tinha imaginado fazer na vida.

Várias questões surgiram na viagem, como essa coisa de mulher viajar sozinha, mas eu nunca pensei nas questões feministas. Na época, eu pensava mais em como isso era algo desconhecido para mim, e louco! Eu tive contato com outras pessoas e foi então que eu comecei a gravar entrevistas nessas viagens, e por coincidência eram todas mulheres. Eu comecei a perguntar como era essa coisa de viajar sozinha, tudo como pesquisa, num momento de lazer.

No ano passado, duas meninas argentinas que estavam viajando foram assassinadas, e a matéria veiculada era “meninas que estavam viajando sozinhas foram assassinadas”, e elas eram duas. Então começaram os questionamentos, você percebe que isso é parte de um preconceito, uma questão profunda.

Cada vez essa história tem crescido mais. Eu já fiz um promo, seguindo a estética do Identidade, me colocando no filme também, mas entrevistando as mulheres, colocando as questões e refletindo. A ideia agora é usar a Internet. Eu já tive experiência na TV, que é o que eu faço, com o cinema, no documentário, e agora eu quero fazer projetos para a Internet, explorar essa outra plataforma.

Confira as fotos do making of de Identidade Cotidiana e de Anna trabalhando na TV Gazeta: