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Edição nº 7 – 2018

Etore Diego dando instruções às suas alunas. Crédito: Arthur Sampaio

Quem já foi ao Centro Cultural São Paulo (CCSP), tradicional ponto do circuito artístico da capital paulista, provavelmente já se deparou com um obstáculo peculiar nos largos corredores: dançarinos que praticam passos de dança no local obrigam quem passa a fazer um pequeno desvio no caminho. Os visitantes já estão acostumados com a movimentação, o que pode tornar um pouco mais difícil o acesso à Pinacoteca Municipal ou à discoteca Oneyda Alvarenga, ambas localizadas nas dependências do Centro. Inaugurado em 1982, a instituição também abriga bibliotecas, espaços expositivos, cursos diversos, teatros e cinema, além de contar com localização privilegiada por estar próxima à estação Vergueiro do metrô.

Wilson Santos, 37 anos, mais conhecido como “Pinto” no meio da dança, toma os corredores para ensaiar breakdance ao menos duas vezes na semana. O bboy (dançarino dedicado ao break) separa suas terças e quintas para encontrar amigos no local. “É a minha pelada” diz ele,  revelando que a preferência pelo ponto se dá pelo chão liso, local coberto e de fácil acesso.

Santos começou a dançar aos 14 anos com seu irmão mais velho, no Cambuci, bairro onde cresceu. É integrante da StyleCrew, grupo fundado em 1994, descendente de crews pioneiras no Brasil. Já fez apresentações internacionais para performances e também competições.

Rodolfo Almeida, 26 anos, o “Grilo”, também pratica passos de break com Wilson. Dançava no StyleCrew, mas agora é integrante da 011Crew. Frequenta o CCSP há nove anos.  Destaca que local é muito conveniente, já que mora próximo à estação Jabaquara. Segundo o bboy, os recém-chegados ao espaço ficam um pouco tímidos, porém ele lembra que o ambiente é de colaboração. “Aqui é um ponto de intercâmbio, troca de conhecimento. As vezes colam uns gringos, trocamos experiências. Aqui também é um espaço para confraternizar”.

Rodolfo começou a dançar em seu bairro e hoje pratica quase todos os dias. Trabalha com dança, é arte-educador e produtor cultural. Organiza desde 2015 a Estação Hip-Hop, na qual acontecem batalhas de break e shows. O evento surgiu em 2015 e inicialmente foi realizado no próprio CCSP. Depois migraram para o Jabaquara com o apoio da Secretaria de Cultura, a fim de fomentar a produção na comunidade.

Os bboys não são os únicos que utilizam o ponto para ensaio. O endereço concentra vários estilos de dançarinos que se expressam em diversos ritmos. Destaca-se o público fã pop sul-coreano, os Kpopers, que fizeram do Centro Cultural São Paulo um reduto dos aficionados pelo estilo musical.  Wellyngton Pimentel, 25 anos, que também é fã de KPop, destaca que o lugar está localizado perto da Liberdade, bairro onde a concentração de Otakus (entusiastas da cultura pop japonesa) e KPopers é muito grande.

Pimentel, que é consultor de vendas, pratica no CCSP há três anos, e costuma passar duas horas ou mais aperfeiçoando suas coreografias. Ele gosta do espaço por ser público e por conseguir chegar facilmente de metrô. Além disso, as superfícies espelhadas da sala de shows e concertos são excelentes para ensaios, pois tornam possível analisar melhor os próprios movimentos. Além de ensaiar o ritmo coreano, Pimentel também pratica stiletto, uma modalidade de dança em que os bailarinos devem usar salto alto. O calçado simboliza poder e atitude, e as músicas geralmente contemplam mulheres fortes do mundo pop, como Beyonce.

Wellyngton também faz parte do grupo Gam’Over. “Fazemos coreografias de KPop, mas misturamos, especialmente com pop americano e break”. O consultor de vendas diz que entre os grupos há muita colaboração. No entanto admite que com a aproximação de uma grande competição o clima fica mais competitivo. Para montar suas apresentações baseia-se principalmente nos passos das girlbands sul-coreanas, que trazem elementos sensuais à dança. “Não vou usar uma coreografia fofa quando tem grupo fazendo algo super sexy” justifica o rapaz.

Reny Xie, 21 anos e Beatriz Caroline, 19, aproveitam as superfícies espelhadas do CCSP para treinar seus passos ao som do pop sul-coreano. Reny frequenta o Centro há pouco mais de um ano, quando regressou da China após uma temporada de estudos. Assim que chegou de viagem, entrou num cursinho pré-vestibular onde conheceu dois colegas que já frequentavam ensaios de Kpop no local. Eles o convidaram para conhecer a movimentação do Centro Cultural e desde então é frequentador assíduo do espaço.

Aos finais de semana, o garoto ensaia coreografias do grupo do qual é membro: Sad Boys Club. Apesar de novo, o grupo já conquistou seu espaço na cena ao ganhar algumas competições importantes, como o Korean Pop Festival, evento que lhes rendeu a premiação máxima.

Wilson Santos, o “Pinto”, praticando passos de break Crédito: Arthur Sampaio

Xie explica que prefere KPop pelas danças chamativas que misturam atuação e canto. O grupo reproduz coreografias de artistas sul-coreanos já consagrados. “Vem aqui todo mundo. Eu pego a versão espelhada dos passos e ensino para os outros” explica Reny.

A complexidade dos movimentos no KPop exige treinos frequentes. O fácil acesso ao CCSP como espaço para ensaio torna o local disputado aos finais de semana. Os amigos revelam que se quiserem pegar um bom lugar (especialmente em frente às paredes espelhadas) devem chegar cedo. “Normalmente chegamos antes das 9h, quando abre. Lá pelas 8 e meia já tem gente esperando na porta”.

Beatriz Albuquerque, estudante de 16 anos, e sua amiga Camila Nunes, 19 anos, que cursa fotografia, também têm dificuldade para garantir um lugar de ensaio. Dizem que nos dias de semana é mais tranquilo, ao passo que aos sábados e domingos a disputa é grande. Por isso, sempre tentam chegar cedo. “Quando abrem as portas tem até gente que se joga no chão para conseguir um espacinho” diz Beatriz.

As amigas integram um grupo com mais duas meninas chamado Blush em que montam coreografias de KPop e pop americano. Beatriz frequenta o Centro Cultural há três anos e já participou de várias competições. Ambas dizem que os grupos costumam se dar bem na convivência dentro do Centro, salvo eventuais disputas pela altura do som.

A guerra de decibéis também é reclamação do professor de dança Etore Diego, 25 anos. Ele ministra aulas de Samba Rock nos corredores do CCSP e critica a “falta de noção” que seus colegas têm com o volume do som. Já faz um ano que ele utiliza o ponto para dar suas aulas. Segundo diz, o local é um espaço aberto e de fácil acesso, o que é conveniente para ele e seus alunos. Uma de suas pupilas, Luana Michelle, 20 anos, veio ao CCSP pela primeira vez, apesar de já ter quatro anos de contato com a dança. Disse que adorou conhecer o lugar. “O espaço é muito legal. Tem muita gente dançando”, observa a jovem.

“Não precisamos pedir permissão. Por indicação acabei decidindo dar aula aqui”, explica o professor. “Aqui vêm várias tribos, e cada um aperfeiçoa seu estilo”.