Terça-feira, 21h, chego atrasada ao sarau comemorativo dos 15 anos da Cooperifa. A chuva já parou e a esquina do bar Zé Batidão está tomada por pessoas de todo tipo. Ainda deslocada, tento entender a distribuição dos ambientes dentro do bar. Difícil ver de fora o que tem da porta para dentro.
Todas as cadeiras estão ocupadas, as pessoas estão grudadinhas, nas mesas, na escada ou umas nas outras. O sarau está rolando solto, com cerveja no copo de plástico e o escondidinho de cartaz. Enquanto isso eu tento me adaptar a lotação, aos papos e tento também parecer minimamente familiarizada com o lugar. Imagino que para qualquer um de fora, o primeiro minuto ali é suficiente para querer pertencer a tudo aquilo.
Entro para pegar uma cerveja. “Licença, licença”. De pouco em pouco consigo um espaço no caminho do bar para parar, ouvir e ver o que estava acontecendo por ali. Olho para esquerda e sentada embaixo da prateleira de livros está um senhora já com seus bons 80 anos, ela segura um bebê nos braços. Juntos descansam enquanto no palco uma mulher canta Cartola “preste atenção, querida, embora eu saiba que estas resolvida, em cada esquina cai um pouco a tua vida, em pouco tempo não será mais o que és” e na próxima estrofe já estão todos em coro. A próxima a subir é uma garotinha, ela lê uma poesia autoral sobre o número 7, sua idade.
Ela chama Bruna, mas nos fundos um sujeito grita “essa é nossa mascote!”.Muitas figuras conhecidas se apresentam a partir dali, sempre ovacionadas. Sergio Vaz, idealizador do projeto, age como mediador do encontro apresentando cada um dos artistas que se arriscam cantando, recitando, desabafando para aquelas cento e poucas pessoas.
Volto para o meu posto lá fora. É fácil esquecer que estou na periferia de São Paulo, mas me lembro quando um homem ao meu lado apresenta a sua roda um parceiro que aparenta ser de longa data “Ai, galera, esse aqui é o maior traficante da Zona Sul”. Não dou tanta importância e com a cerveja no fim entro para pegar mais bebida no bar, agora um jovem está no palco e pede com firmeza que “Não confundam nossa ausência de paz com a nossa sede de guerra”.
Me lembro mais uma vez onde estou e percebo o quanto toda as manifestações são sedentas de olhares mais cuidadosos para aquela realidade.
Sobem mais personalidades da comunidade, sempre se chamando de “família”. A consciência política também está ali. Uma senhora que manifestou sua opinião sobre o papel da mulher na comunidade encerra seu manifesto e é aplaudida de pé “A Dilma caiu, senhores, mas as mulheres continuam aqui”.
Encontro um lugar mais próximo do palco e acomodada, vou ficando. O sarau vai chegando ao fim. Lamento e faço uma promessa: não ficarei por muito tempo longe desse lugar.