Na abertura do evento, Kadu Fernandes e Myrella Nascimento, uma das fundadoras do Café Filosófico, apresentaram músicas próprias e de outros artistas, como Nina Simone e Dorival Caymmi.
“O racismo questiona a humanidade dos negros”, é como Marcilene Souza inicia o debate, ressaltando a necessidade de pensar na influência que os meios de comunicação exercem nas relações sociais do país, a segunda nação negra do mundo.
Marcilene disse que apesar da enorme população negra no Brasil, a nossa televisão ainda é muito europeia e, para embasar a afirmação, indicou a pesquisa “Onde está no negro na TV pública?”, feita pela Fundação Cultural Palmares em 2006.
“Muitas vezes, quando ligamos a TV ou compramos uma revista, temos a sensação de não estarmos no Brasil, por falta da diversidade racial. Quase não se percebe a presença de negros e, quando há, qual é o foco dessa participação? Não basta aparecer na mídia, importa como aparecemos nela, tendo o cuidado para não reafirmar certos estereótipos já existentes, principalmente os relacionados à mulher negra”, diz Marcilene.
Ela afirmou que os meios de comunicação cumprem um papel fundamental, devido ao grande impacto na construção e manutenção de desigualdade. Em seguida, valorizou as ações da juventude, que vêm também de brancos: “elas têm contribuído muito com o movimento social negro” e, assim, encerra: “eu sou negro e eu sou lindo, eu sou negro e meu cabelo não é ruim”.
Dando continuidade ao assunto, Maurício Pestana, mais conhecido pelos trabalhos como cartunista e editor da Revista Raça, contou que em todas as redações onde trabalhou, observou a quase inexistência de negros e explicou que a visão sobre a questão racial, sobre o que é ser negro, vivenciando a rotina em boa parte das redações, “sempre [será] de um ponto de vista de brancos, porque são eles quem vão falar e mostrar isso no cotidiano [uma vez que quase sempre ocupam os cargos de responsabilidade]. Por mais esforçados e solidários que sejam, não é a mesma coisa.”
Ele contou também sobre os esforços que fez, como cartunista, para não reafirmar a imagem negativa que muitos associam ao negro. Quando precisava desenhar um ladrão, por exemplo, fazia-o branco, em uma tentativa de alertar e fazer pensar sobre a associação natural da imagem do bandido a pele escura.
Além disso, comentou sobre a escassez de referências na área: “quando se começa a desenvolver sua arte, é natural que procure alguém para se espelhar e eu não tive isso. Precisei desenvolver sozinho essa caminhada, porque não tinha nenhum cartunista negro antes de mim”. E, para sintetizar seus ideais, afirma: “minha arte tem que servir para mudar e não para satirizar”.
Pestana também se destaca por prestar assessoria a editoras didáticas, cuidando de como o negro é retratado para jovens em fase de aprendizado e alerta: “o processo de discriminação vai além das mídias, porque grandes meios de comunicação estão ligados à produção de livros didáticos. A Abril, por exemplo, mantém a Ática e a Scipione, importantes editoras da área educacional. Vê-se toda uma estrutura de formação do povo brasileiro passar por uma elite branca, por editoras brancas, por redações brancas”.
Já finalizando sua reflexão, Pestana deixa uma mensagem otimista, ressaltando a força que movimentos sociais em prol da questão racial têm adquirido, principalmente agora, com a maior influência das mídias sociais, e o crescente número de jovens negros em escolas e faculdades.
Francisco Nunes, professor de filosofia da faculdade e mediador do debate, encerrou o último Café Filosófico do ano resgatando o sucesso desse evento ao longo de 2013, que trouxe temas interessantes, atuais e muitos deles relacionados à diversidade cultural.
Ano que vem o Café Filosófico volta com mais assuntos para você explorar!