Na noite do último sábado, dia 6 de abril, em um canto da Praça Roosevelt – famosa pela arquitetura propícia aos esportes radicais e por ser um dos endereços alternativos de artistas paulistanos – duas bicicletas atraíram a curiosidade das pessoas. Cada qual levava em sua garupa um homem em pé, coberto por um pano preto, e uma caixa.
Os chamados “Ciclistas Bonequeiros” participaram nesse sábado do Festival do Baixo Centro, evento que acontece entre os dias 5 e 14 de abril, reunindo diversas atividades divididas em shows, oficinas, teatros, letras, debates e outras artes. Eles são um desdobramento da Cia. Catraca do Riso, um grupo da zona sul de São Paulo que exerce atividades teatrais desde 2008, com base em estudos da comicidade. O grupo amplia e cria uma relação com o público da periferia da Zona Sul da cidade, e tem como locais de ensaios o Parque Santo Dias e a Associação dos Moradores do Jardim Piracuama.
A vertente ciclista da Companhia trabalha com o teatro Lambe-Lambe – um palco em miniatura confinado em uma caixa preta de dimensões reduzidas onde são apresentadas peças teatrais de curta duração através da manipulação de bonecos, para um espectador por vez – montado em cima da garupa de uma bicicleta. Além de utilizarem o meio de transporte alternativo, as performances são feitas com objetos e bonecos de materiais recicláveis e reutilizáveis.
Os assuntos abordados para as peças são variados: vão de liberdade de expressão até folclore e literatura. Nessa amostra os bonecos contam a história de Paulo Eiró, poeta abolicionista do final do século XIX, bastante excêntrico e pouco conhecido.
Nascido em Santo Amaro, ele chegou a cursar Direito na USP, porém abandonou o curso para matricular-se em um Seminário. Lá, onde também não se formou, teve grande parte de sua obra destruída, em decorrência de seus poemas abolicionistas destoarem dos preceitos da Igreja da época.
Hoje há em Santo Amaro o Teatro Paulo Eiró, nomeado em sua homenagem, e um Painel do artista Júlio Guerra, Homenagem às Artes, instalado em frente, com um trecho de seu poema O Sobrado. É o mesmo utilizado na peça dos Ciclistas Bonequeiros. O único quadro-retrato do poeta se encontra atualmente na Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco.
Uma das caixas do Teatro Lambe- Lambe apresentava a história da infância de Paulo Eiró, em Santo Amaro. Já a outra fazia uma brincadeira intercultural, com um garoto contemporâneo, que após conversar com a imagem do poeta no quadro da parede da Faculdade de Direito e conhecer um de seus poemas, é desafiado por ele a cantá-lo em tom de rap.
Com união de arte, conscientização urbana e meio ambiente, o projeto dos Ciclistas Bonequeiros visa transmitir cultura de maneira livre e sustentável. Com o seu teatro nômade, eles pedalam por São Paulo fazendo apresentações em parques, gratuitamente, a quem se interessar.