Quinta-feira, 2 de outubro, foi o segundo dia do I Seminário Cásper Líbero de Tecnologia no Ensino Superior. O seminário teve como objetivo discutir como os novos meios digitais podem contribuir para o aprendizado em sala de aula, uma vez que essas novas tecnologias se tornaram parte do repertório da sociedade moderna atual.
Em poucos anos, as inovações tecnológicas tornaram-se parte integrante das salas de aula. Os professores se depararam com alterações no comportamento dos alunos e nas formas de ensinar. A introdução das mídias digitais no processo educacional trouxe novos desafios e tornou necessário, cada vez mais, adaptar-se a essas mudanças. Assim, professores, pesquisadores e estudantes, na tentativa de entender e usufruir o melhor dessas tecnologias, compareceram ao evento e compartilharam suas perspectivas e indagações sobre o tema.
Com mediação do professor e doutor em Ciências da Comunicação, Dimas Kunsch, a primeira parte deste segundo dia do seminário iniciou com quatro relatos de educadores sobre suas experiências com plataformas e projetos.
Melina Sternberg, colaboradora do Veduca, portal online que oferece cursos livres e gratuitos em Ensino Superior, ressaltou a importância dos conteúdos disponíveis na internet para a interatividade entre os participantes; não como uma substituição das salas de aula, mas como complemento ao processo de educação.
Abordando outro aspecto, Tiago da Mota e Silva, formado em jornalismo pela Cásper Líbero e mestrando em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, introduziu a noção de newsgame como uma maneira de enriquecer a formação do jornalista por meio dos jogos. Nesse sentido, o jogo é entendido como uma forma de extensão para o profissional perceber o que está externo a ele e se reconhecer na educação mimética. O jogo não é mais pensado como uma plataforma linear, mas como uma ambiência comunicativa e a apuração como a análise em campo de tudo o que pode se tornar um jogo.
Danielle Denny, mestre em Comunicação pela Cásper Líbero e professora da Fundação Armando Alvares Penteado-FAAP e da Unip, por sua vez, relatou a dificuldade em despertar o interesse dos estudantes de comunicação nas aulas de Ética e Educação que ministra. Como tentativa de superar esse conflito, passou a utilizar a ferramenta digital Prezi e realizou uma pesquisa qualitativa com seus alunos de Rádio e TV da FAAP, os quais foram favoráveis ao uso dessa plataforma. Entre as vantagens oferecidas pelo Prezi, Danielle ressalta o dinamismo, o conteúdo audiovisual, os hiperlinks e o compartilhamento.
Dario de Barros, bacharel e mestrando em Jornalismo pela Cásper Líbero, discorreu sobre o Design Thinking como abordagem para o uso de tecnologias em sala de aula. Propôs uma forma de pensar na educação a partir da problemática, considerando as necessidades dos estudantes na cultura e no contexto em que estão inseridos.
Celular: herói ou vilão?
Após os relatos de experiências, o debate prosseguiu com o professor doutor Marcos Guterman, que fez uma apresentação sobre “Por que limitar o uso de equipamentos eletrônicos em sala de aula?”. Guterman expôs sua postura contrária ao uso de celulares em suas aulas. Apesar de se considerar adepto da tecnologia, como do PowerPoint, acredita no papel do professor, necessário “tanto antigamente como agora”, e na importância do “método tradicional de ensino baseado na oralidade”. Com honestidade, admitiu permanecer no grupo dos “resistentes”, aqueles que ainda hoje proíbem a utilização de equipamentos eletrônicos durante as atividades educacionais, exemplificando que eventuais dúvidas devem ser resolvidas primeiramente com o professor e não com ferramentas externas. “A transmissão de conhecimento […] foi criada no gogó”, afirmou o professor, complementando que “a tecnologia pode ajudar, mas não é ela que determina a qualidade do conhecimento […] a única tecnologia é o cérebro, é a capacidade de transmitir e de receber”.
A professora Gaya Machado, coordenadora do Nucleo de Tecnologias Educacionais (NTE) da Cásper, na sequência, contribuiu explicando sobre os projetos de teste criados pelo NTE. Uma das ferramentas introduzidas foi o Moodle, um software livre e colaborativo em fase de experimentação na disciplina de Sociologia, lecionada pelo professor Liráucio Júnior.
A professora Bianca Santana, que leciona a disciplina de Novas Tecnologias no curso de Jornalismo, trouxe sua experiência realizada em conjunto com a professora Michelle Prazeres nas quatro turmas do 3º ano. Primeiramente, expôs a ideia da formação de rodas em sala de aula, as quais estimularam os alunos ao debate, para uma aula expositiva ministrada a seguir. Ressaltou a importância de questionar o que cada aluno espera da disciplina e de debaterem entre si as conclusões a que chegaram. Como método de aprendizagem, incluiu em sua matéria as atividades em duplas e grupos para troca de conhecimentos e para maior dinâmica, bem como o “do it yourself”, isto é, o incentivo aos estudantes a utilizarem ferramentas escolhidas por eles mesmos (sob orientação) para construírem seus projetos. O resultado desse trabalho foi satisfatório e, em apenas um bimestre, os alunos trouxeram grandes reportagens às salas, realizadas com notável dedicação e empenho.
Encerrando as apresentações, um rico e importante debate foi realizado acerca dos temas tratados pelos educadores. O professor doutor Carlos Costa, coordenador do curso de Jornalismo, mencionou que não é uma imposição necessária o uso de novas tecnologias para despertar o interesse dos alunos, exemplificando com dois casos que presenciou, ao visitar salas para dar recados aos discentes: o interesse e a participação dos estudantes do 4º ano recortando e colando jornais na aula de Jornalismo Econômico ministrada pelo professor Marcos Guterman; e os alunos conversando em círculo na aula de filosofia ministrada pelo professor Fabrício Tavares. Comentou ser contra o uso indiscriminado de smartphone nas suas aulas, pois alegou ser muito complicado disputar com esse dispositivo, mas disse ser favorável à aplicação dessas tecnologias como meio para complementar alguma informação importante. Reavaliou também a expressão usada por Guterman sobre o conceito de “transmissão de conhecimento”: “a questão aí não é transmitir conhecimento, é construir junto com os alunos o conhecimento, trazer o aluno para essa reflexão”. Começou, então, uma discussão sobre construir ou transmitir o conhecimento.
Maiores perspectivas sobre o tema foram geradas a partir das argumentações. A professora Bianca Santana, por exemplo, ao acreditar que o celular é uma ferramenta útil para os alunos em casos de dúvidas e consultas, ampliou a questão analisando a necessidade de controle por parte dos educadores e criando uma problematização em torno do tema. A professora Danielle Denny, complementando, procurou entender a questão psicológica por trás do (não)olhar do aluno. “A minha carência de professora identificou ali uma pessoa que estava me negligenciando”, afirmou sobre um aluno que, aparentemente, não prestava atenção em suas aulas, mas que, em certo momento, demonstrou estar atento a todas as falas da professora.
Danielle abordou, então, mais um conflito: por que proibir o uso de plataformas digitais se os estudantes assimilam um conteúdo oral e didático enquanto estão conectados? Seria essa necessidade do olho no olho apenas um incômodo do educador, se o não olhar para o professor não significa necessariamente que o aluno está desatento?
Durante o debate, muitos educadores dividiram opiniões e experiências que viveram. Dessa forma, os pontos de vista foram ampliados e diversificados, enriquecendo o conteúdo do seminário e contribuindo para a formulação de mais questionamentos. Para o professor Luís Augusto Dinamarca Barna, mestrando em Comunicação pela Cásper Líbero e professor de Marketing Digital do curso de Jogos Digitais do Complexo Educacional FMU, por exemplo, o celular não é algo prejudicial, mas um meio tecnológico necessário às aulas na medida em que outros meios não funcionem corretamente, como o Prezi. “A gente tem que mediar esse conteúdo com a realidade do aluno”, acrescentou.
Tiago da Mota, quando questionado pelo professor Barna sobre a falta de diversão dos jogos educativos, adicionou mais um assunto a ser repensado: “Diversão é um conceito muito difícil de trabalhar […] A questão é a seguinte: um jogo não precisa ser divertido ou apresentar essa diversão que a gente associa ao riso”. E mencionou como exemplo uma pessoa jogando Sudoku online: ela não está rindo ou não parece estar se divertindo, mas, pelo contrário, está tensa e atenta. Para ele, “o jogo tem que ser significativo”. Bianca concordou ao afirmar que “muitas das nossas aulas em que as pessoas mais se envolvem é porque elas estão angustiadas, preocupadas com o resultado a conseguir”.
A professora Ivoneti Ramadan, também contrária ao uso do celular em ambiente didático, baseou seu argumento em uma entrevista do jornal Folha de S.Paulo com um economista de Harvard, citando que “o uso excessivo de aparelhos eletrônicos limita as conexões neurais”. Ela fez seu agradecimento sobre o aprendizado adquirido durante os relatos e as considerações apresentadas nos dois dias de seminário.
Marcos Guterman complementou demonstrando sua preocupação com uma geração de indivíduos que não sabe ler – não no sentido de juntar letras, mas de não compreender o que leem, nas raras vezes em que o fazem – e as formas de fixar o conhecimento. “Parece-me que as pessoas, me refiro aos muito jovens, não estão conseguindo fixar o conhecimento por causa dessa fragmentação causada pela dispersão de fontes de supostas informações”. Bianca Santana, no entanto, criticou essa visão alegando que talvez seja uma percepção elitista do que é essa leitura.
Melina Sternberg levantou mais uma questão para o debate: as formas de absorver o mundo pelas crianças de hoje, que parecem ser diferentes das crianças de outros períodos, e a questão das inteligências múltiplas. “Será que dá para coexistir na mesma sala de aula várias formas de aproveitar essas várias inteligências?”, indagou.
Liráucio Girardi contrapôs dizendo que uma das formas de alcançar bons resultados é estabelecer um acordo com os alunos sobre os usos do celular durante as aulas, entendendo até que ponto esses usos são inteligentes. E Gaya Machado, ao final do debate, concluiu que “o nosso papel como professor é guiar o aluno na construção do conhecimento de uma forma que ele se identifique”.
O mau funcionamento, a lentidão para acessar as ferramentas e a perda de conteúdo como em softwares proprietários (como o blackboard), dentre outras falhas técnicas que os meios digitais podem ocasionar, foi mais um tópico levantado pelos professores nessa longa conversação, que certamente acrescentou muito àqueles presentes como palestrantes ou como assistentes.
A proposta desse encontro, iniciativa do curso de Jornalismo em parceria com o Programa de Pós-Graduação da Faculdade Cásper Líbero, obteve grande sucesso em seus dois dias de seminário e construiu pontes para a elaboração de novos projetos e pesquisas, bem como esclareceu dúvidas e questões frequentes aos professores e pesquisadores. Espera-se agora a organização de uma publicação que registre todos esse conhecimento construído nas duas intensas rodadas de apresentações.